Uma mulher foi agredida e abandonada em uma área erma de Canindé, no sertão cearense, pelo então namorado, o policial militar Hildo Melo de Paiva. Depois da agressão, ela divulgou fotos e vídeos com as marcas do espancamento que sofreu.
A vítima filmou o momento em que foi estava dentro do carro com o homem denunciado pela agressão. O veículo do policial agressor segue uma viatura do Batalhão de Policiamento do Raio (BP Raio), um esquadrão da Polícia Militar.
Por nota, a defesa do advogado negou as acusações. “Os fatos alegados pela acusadora serão em tempo oportuno devidamente esclarecidos no bojo do processo judicial”, disse a nota.
O rosto dela está coberto de sangue. “Pra onde vocês estão me levando? Você está seguindo o carro do BP Raio por quê? Pra onde vocês estão me levando? O meu celular tem internet”, diz a mulher.
A Justiça concedeu medida protetiva de urgência após registro da ocorrência. O agressor foi afastado da função que exercia na Polícia Militar, mas continua na corporação.
Os vídeos circularam entre os moradores da cidade e causaram revolta. O caso ocorreu em setembro deste ano, e a vítima não quis comentar as agressões à época. Agora, a mulher decidiu falar sobre o caso. Ela conta que, desde que denunciou o policial Hildo Melo de Paiva, ele perdeu a função no Batalhão de Policiamento do Raio (Ronda de Ações Intensivas e Ostensivas) na cidade de Boa Viagem.
Contudo, afirma que ele segue em atividade no Policiamento Ostensivo Geral (POG) no mesmo município. E que, sem poder se aproximar dela, tem feito ameaças em forma de recados enviados por amigos em comum.
A mulher namorou o policial por um ano e cinco meses e relata que já havia sofrido empurrões e puxões de cabelo antes do episódio em que foi espancada. O motivo para as brigas eram as cobranças que ela fazia ao descobrir que havia sido traída. “E aí, no outro dia, quando eu ia falar, ele dizia que não lembrava disso, que ele estava bêbado”, relatou à equipe da TV Verdes Mares.
O g1 questionou a Secretaria da Segurança Pública e a Polícia Militar do Ceará sobre as denúncias de agressão contra o policial; questionou também o motivo de uma equipe do BP Raio acompanhar a mulher agredida dentro do carro do policial Hildo Melo. Os órgãos responderam apenas que a Controladoria-Geral de Disciplina (CGD) iria se manifestar sobre o caso.
O g1 também questionou a CGD — órgão que investiga infrações e crimes cometidos por agentes da segurança no Ceará –, que também não respondeu sobre as questões. Em nota, a CGD disse apenas que abriu um “processo disciplinar para devida apuração na seara administrativa”.
Discussão após beijo na frente da namorada
O episódio em que a mulher foi espancada aconteceu no início de setembro. Conforme o relato dela, o casal bebia cerveja quando três mulheres se juntaram a eles. “De repente, do nada, uma delas beija na boca dele. Eu dei um empurrão nela e disse ‘que é isso, Hildo?’… E aí elas saíram, foram embora. E a minha reação foi só de ficar estática, em crise de choro”, relatou. Depois da cena, um amigo do policial teria aconselhado Hildo a levar a namorada para casa.
Dentro do carro, ela começou a questionar a atitude do namorado, dizendo que o que ele havia feito não era “papel de homem”. A mulher lembra que reclamava bastante e chorava, enquanto o namorado permanecia calado. Ela estranhou quando ele não parou na casa dela e começou a perguntar para onde estava sendo levada.
Ao chegarem em uma rua sem movimento, por volta das 17h, ela conta que o namorado saiu do carro, abriu a porta do lado dela e disse: “Espera aí, que agora eu vou te mostrar o que é ser homem”.
“Ele me puxou pelos cabelos e começou a me dar socos nos olhos, nos peitos, nas costas… Me jogou no chão. Ele dizia: ‘olha, sua vagabunda, isso aqui é pra você me respeitar, que eu sou uma autoridade. Eu já tô cansado das suas reclamações’. E eu não tinha reação, eu só tentava me defender, mas não tinha como. Ele tem 1,93cm de altura, ele estava armado. Eu não falava nada, eu estava com medo de ele me matar”, recorda a mulher.
Ela conta que, depois que ele parou as agressões, ela voltou para dentro do carro e ficou encolhida quase abaixo do banco. O policial teria voltado para o carro e dito que eles iriam voltar para uma festa que ocorria no local. Segundo ela, Hildo percebeu a quantidade de sangue no rosto dela e tentou consolar a namorada, prometendo que eles tomariam cerveja, iriam para um motel e que nunca mais bateria nela.
“Ele queria que eu saísse do carro pra tomar mais uma cerveja com ele, e eu disse que não queria sair. Eu só sabia chorar, eu não tinha reação de nada. E eu tinha medo de abrir o carro, sair e ele me dar um tiro pelas costas”, detalha.
Quando o policial parou em um bar e posicionou a mesa perto do carro, a mulher ainda teve medo de deixar o veículo. Foi quando um amigo de Hildo chegou para conversar com ele que ela resolveu sair do carro gritando que havia sido espancada por ele.
Ela conta que estava sangrando bastante. Com as pancadas na boca, ela ficou bastante ferida por usar aparelho ortodôntico. Um pedaço de uma obturação dental também teria caído por conta das agressões.
“Ele me deu um empurrão pro meio do asfalto, e a rua estava bastante movimentada. Eu quase fui atropelada. Eu me ralei no joelho, nos braços, machuquei as mãos também. Tudo isso foi constatado pela médica legal, eu tava cheia de hematomas. Desde então, tem sido um inferno”, afirma a mulher.
Depois disso, ela narra que o policial foi embora, deixando ela sozinha no bar.
Medida protetiva
À noite, a mulher recebeu mensagens do namorado dizendo que esperava que ela ficasse bem. Ela bloqueou Hildo e, no dia seguinte, voltou a conversar com ele. Ela enviou fotos e vídeos que havia feito após ser agredida, de dentro do carro dele.
Em vídeos gravados no dia da agressão, é possível ver uma viatura do Batalhão do Raio acompanhando o veículo do policial à frente.
“Você fez esses vídeos só para me condenar” e “Não sou bandido” foram algumas das mensagens do policial em resposta às imagens. A mulher informou que já havia feito exames de corpo de delito. Uma das mensagens de Hildo ainda tentava argumentar que ela havia sofrido arranhões ao tentar sair do carro dele.
No dia 14 de setembro, o juiz da Vara Única Criminal da Comarca de Canindé concedeu medida protetiva de urgência prevista na Lei Maria da Penha. A medida se baseou no depoimento que a mulher prestou à Polícia Civil após as agressões.
O documento estabelece que Hildo Melo está proibido de se aproximar a menos de 200 metros da mulher, proibido de manter contato com ela, com familiares e com testemunhas, além de não poder frequentar a casa ou o local de trabalho da vítima.
Desde então, ela tem recebido recados que ele manda por meio de amigos em comum, afirmando que ela fez com que ele perdesse tudo
Ela afirma que está sendo acompanhada por advogada e movendo processo contra ele pelos episódios de violência contra mulher. No entanto, desconhece se ele está respondendo por algum processo disciplinar na Polícia Militar.
Por fim, o advogado de defesa do policial disse que é “totalmente inverídico” que ela estaria sofrendo ameaças por parte do defendido. “Afirma o Sr. Hildo Melo, por sua defesa, que desde o ocorrido se colocou imediatamente à disposição das autoridades policiais para a apuração da verdade e solicitará as diligências necessárias a elucidação dos fatos e consequente busca pela justiça”, complementou.
g1