Tomado de surpresa pela punição do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) devido à presença de Carol Portaluppi no gramado da Arena, o Grêmio montou uma comitiva para tentar reverter a perda de mando de campo na final da Copa do Brasil. O departamento jurídico se mobilizou para entrar com o recurso entre esta quinta e sexta-feira e desqualificar o entendimento de que houve gravidade no caso.

A possibilidade de disputar a decisão contra o Atlético-MG longe da Arena se tornou realidade na tarde de quarta, quando a maioria dos auditores da Terceira Comissão Disciplinar do STJD concluiu que a presença da filha do técnico Renato Portaluppi na comemoração da classificação diante do Cruzeiro trouxe “elevada gravidade” ao evento. Na denúncia, a Procuradoria do órgão enquadrou o clube no artigo 213 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD) por não prevenir e reprimir invasão de campo, fixando como pena multa de R$ 100 a R$ 100 mil.

Os advogados do Grêmio discordam da tese dos auditores e usarão esta situação no recurso com pedido de efeito suspensivo. Ainda que tenha a solicitação temporária atendida e consiga decidir a Copa do Brasil na Arena, o Grêmio terá de aguardar o julgamento em segunda instância, no Pleno do STJD. No Rio de Janeiro, após ouvirem a sentença na sede do órgão, o diretor jurídico Nestor Hein e o advogado Gabriel Vieira se reuniram em um escritório de advocacia terceirizado para montar a peça a ser protocolada.

A intenção é entrar com o pedido de efeito suspensivo até sexta-feira, 48 horas após o julgamento. Os gremistas também tentaram desqualificar a presença de Carol como uma invasão, já que foi autorizada pelo clube. O protocolo prevê que pessoas aptas a estar no campo de jogo precisam constar em uma lista entregue à CBF, mas isto é visto como mera burocracia.

Em entrevista à Rádio Gaúcha, Hein reclamou da postura de alguns auditores durante a sessão, que teriam citado Renato e Carol como figuras “midiáticas”. Ele tratou a decisão como “infeliz” e reiterou não haver precedentes para uma punição “tão severa”.

– O julgamento é todo exótico, até porque a própria Procuradoria não pediu uma punição tão grave ao Grêmio. Em determinado momento do julgamento, foi decidido por essa punição gravíssima, considerando ordem de caráter pessoal para o técnico Renato e sua filha. Imagino que a justiça se fará. Todos têm seu dia infeliz. Hoje (quarta-feira) foi um dia infeliz da comissão. Não há precedentes para uma punição tão severa – disse Hein em entrevista à Rádio Gaúcha.

Ponto de vista legal

O advogado especializado em Direito Desportivo e autor do blog Esporte Legal, do GloboEsporte.com, José Eduardo Junqueira Ferraz, entende que o abraço “de filha para pai”, como defende o Grêmio, não abranda o problema do ponto de vista legal. Isso porque o artigo 213 traz, no parágrafo primeiro, que “quando a desordem, invasão ou lançamento de objeto for de elevada gravidade ou causar prejuízo ao andamento do evento desportivo, a entidade de prática poderá ser punida com a perda do mando de campo de uma a dez partidas”

– Não faz diferença nenhuma. Tanto o Estatuto do Torcedor quanto o CBJD têm dispositivos que vedam que terceiros fora do contexto do jogo estejam no perímetro do campo por medida de segurança. Se há este acesso, é uma falha de segurança do mandante. Todo terceiro estranho oficialmente à disputa é tido como invasão consentida. Do ponto de vista processual, o correto seria a Procuradoria ter feito menção às duas penalidades (perda de mando de campo ou multa) – explica Ferraz.

A questão da reincidência do Grêmio também pode ser um complicador, afirma o advogado, mesmo que tenha sido absolvido no caso da mulher que entrou no campo da Arena após o empate em 0 a 0 com o Palmeiras, pelo Brasileirão. Na ocasião, o clube registrou Boletim de Ocorrência conforme prega o parágrafo terceiro do mesmo artigo do CBJD, que “exime a entidade de responsabilidade”. Com relação a Carol, o Tricolor não tomou tal atitude.

A melhor saída para os gaúchos, de acordo com Ferraz, é citar a sentença “ultra-petita”, ou seja, quando o julgamento concede punição além daquela que foi pedida pelo autor da ação. No caso, a Procuradoria não citou a infração como “grave” e pediu que o clube fosse apenas multado.

– É um argumento sólido, alegando que a sentença foi além do pedido da Procuradoria. Se isso for entendido, o processo pode ser suspenso. Mas o Pleno (do STJD) também pode rejeitá-lo – argumenta o especialista.

Relembre

Renato chamou a sua filha nos minutos finais da partida contra o Cruzeiro, na Arena, que marcou a classificação para a final contra o Atlético-MG. Carol aguardava no túnel da zona mista da Arena e foi conduzida ao campo por um segurança. Sentou no banco de reservas e, logo depois, o árbitro apitou o final da partida. A filha deu um abraço no pai à beira do campo e registrou a festa da torcida e dos jogadores dentro do gramado.

Na súmula da partida, o árbitro Thiago Duarte Peixoto relatou o incidente. Informou que o quarto árbitro, Francisco Neto, e o delegado da partida, Nilson de Souza, o avisaram que Renato chamou a filha para entrar no gramado antes do apito final. Mas ela sentou no banco de reservas e foi impossível retirá-la a tempo, até porque logo depois ele assinalou o fim do jogo.

O Grêmio foi enquadrado pela Procuradoria do STJD no artigo 213 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD) por “deixar de prevenir e reprimir invasão de campo ou local da disputa do evento”. Conforme a legislação, em caso de culpabilidade, a pena prevista é multa de R$ 100 a R$ 100 mil.

Os votos dos auditores

Relator, Vanderson Maçullo (multa de R$ 30 mil e perda de mando)
“Um dos processos que mais estudei devido o que está em jogo. Assisti vários vídeos e, em relação a denúncia, sugiro determinar baixa dos autos para verificar possível infração do técnico Renato Gaúcho por também ter dado causa a essa invasão de campo. Ao mérito, o fato é incontroverso. O 213 fala em deixar de prevenir e reprimir. Estou mantendo a denúncia e entendo que a filha do treinador não poderia estar ali. Neste caso aplico a pena de multa de R$ 30 mil e a perda de um mando de campo. O tribunal não está julgando o amor de pai e filha e sim um ato que não é permitido”.

Otacílio Araújo (multa de R$ 30 mil e perda de mando)
“Acho que primeiro foi uma falta de respeito do treinador chamar sua filha para o banco de reservas e depois entrar em campo. Falta de respeito ao campeonato e também a instituição Grêmio. Ali ele quebrou as próprias regras. Um dirigente não pode ficar no banco de reservas e ela também não. Denegriu a imagem do Grêmio e, principalmente, deste tribunal. A invasão ou não acho que não houve, pois foi autorizada a entrar. Quando um segurança iria barrar a filha do técnico que é ídolo do clube? Acho que a medida socioeducativa não vai atender. A identificação houve, mas se fosse qualquer outro torcedor iria para o juizado e ficaria seis meses sem ir ao estádio”.

Manoel Bezerra(multa de R$ 30 mil e perda de mando)
“Se não aplicarmos a norma como deve ser vamos abrir um precedente. Houve uma invasão e é um caso tipicamente midiático. O clube poderia ter feito um boletim de ocorrência. O treinador descumpriu. Só uma pena pecuniária é pouco. Entendo como elevada gravidade por descumprir o previsto. Voto por R$ 30 mil e perda de um mando de campo e para o processo ser baixado para análise da conduta do treinador”.

Jurandir Ramos (multa de R$ 30 mil e perda de mando)
“Acho que se aplica na íntegra o inciso II por invasão de campo”

Sérgio Martinez (multa de R$ 10 mil)
“A Senhorita Carol Portaluppi assistiu o jogo da tribuna. Faltavam dois ou três minutos e ela foi chamada. Lamentável que sua cartilha (advogado) não tenha sido obedecida. Só lamento que o Grêmio não tenha tomado no momento uma autoridade. Acho um exagero punir com perda de mando. Vou ficar com multa de R$ 10 mil” 

Fonte: Globoesporte.com

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