O uso da tornozeleira eletrônica, medida cautelar alternativa à prisão, vem sendo ampliado no Ceará. Em dois anos, a quantidade de pessoas monitoradas pelo aparelho triplicou. Conforme estatísticas da Secretaria da Administração Penitenciária (SAP), no mês de julho de 2017 eram 1.589 tornozeleiras ativas. Já em julho deste ano de 2019, são 4.876 aparelhos em uso.
Há dois anos, os dados sobre pessoas monitoradas por tornozeleiras se resumiam à divisão por gênero, sendo prioritariamente sobre o sexo masculino. O levantamento atual mostra que o monitoramento abrange toda a territorialidade do Estado e desmembra, com detalhes, quem são os ‘tornozelados’ no Estado. Dos 4.876, 706 são oriundos de audiências de custódia, 188 acusados da Lei Maria da Penha e os demais estão elencados como ‘outros’.
Ainda de acordo com a nomenclatura da SAP, os monitorados ativos por núcleo são 2.497 da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), 702 provenientes das audiências de custódia e 1.677 no interior do Estado. Com relação aos tipos de decisão, predominam as medidas cautelares (2.090), prisão domiciliar (1.230) e recolhimento noturno (998).
Em 2015, a Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar e a Secretaria de Justiça do Estado (Sejus) acordaram ampliar o projeto de Monitoramento Eletrônico para os infratores da Lei Maria da Penha por meio da utilização de tornozeleiras eletrônicas. À época, a decisão foi tomada para, de acordo com as autoridades, proporcionarem mais segurança às mulheres agredidas, porque a qualquer aproximação do agressor com a mulher vitimizada, o equipamento dispara sinal.
Condições
A presidente do Conselho Penitenciário do Estado (Copen), advogada Ruth Leite Vieira, considera o uso das tornozeleiras como alternativa eficiente para baratear os custos do Governo, mas, até então, não se mostrou suficiente para desafogar o Sistema Penitenciário.
A SAP informou que o monitorado hipossuficiente, ou seja, que não tem recursos, custa R$ 169 mensais aos cofres públicos, enquanto um preso recolhido nas unidades prisionais pode custar mais de R$ 2 mil por mês.
“Para diminuir a população carcerária é preciso reduzir o número de presos provisórios. O que percebemos é que muitos presos com tornozeleiras se sentem até mais vigiados do que na prisão. Esse aumento significativo já era previsto, principalmente por esta atual gestão ter vindo muito determinada a fazer uso desta política. Apesar da eficiência, isso não significa que uma parte dos presos rompa a tornozeleira e fuja. Nós não temos um número oficial da reincidência, mas, por análises, vemos um número alto”, afirmou Ruth Leite.
O levantamento da Secretaria mostra que o sistema estadual registra 19% de violações, enquanto a média nacional é em torno de 35%.
Nos últimos dois meses, dois casos envolvendo ex-presidiários repercutiram em Fortaleza. Em junho, policiais prenderam um homem de 18 anos, no bairro Couto Fernandes. Enquanto estava com tornozeleira eletrônica, Israel de Assis Santos invadiu e assaltou um salão de beleza no bairro Montese. Ele já tinha antecedentes por tráfico de drogas e tinha sido preso em março.
No mês passado, um homem identificado como Misael de Sousa, 23, foi morto a tiros dentro do banheiro da própria casa. A Polícia informou que Misael utilizava tornozeleira eletrônica e tinha passagens por roubo e receptação. A vítima tentou fugir do ataque, mas foi perseguida e morreu ainda dentro de casa.
Soltura
As determinações pelo uso das tornozeleiras partem do Poder Judiciário. Nos casos de medidas cautelares, o juiz pode entender que não é necessário manter a prisão preventiva, porém, quer que as autoridades permaneçam com determinado controle sobre o paradeiro do réu. Muitas das medidas cautelares vêm no momento em que os processos são revisados.
De acordo com a Secretaria, desde o último mês de março, “o corpo de advogados da Secretaria da Administração Penitenciária, em parceria com a Defensoria Pública do Estado do Ceará, realiza um trabalho de revisão processual dos internos recolhidos nas unidades prisionais cearenses”.
A SAP informou que nestes quase seis meses a força-tarefa conseguiu revisar a situação jurídica de 17.960 presos, em 11 unidades diferentes.
Para a Pasta, o trabalho acelerou o acesso à Justiça, tendo efetivado a progressão de regime de quase duas mil pessoas neste período e também estabilizado o número de pessoas recolhidas no sistema prisional do Ceará.
A reportagem solicitou entrevista com fonte do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) a respeito desse aumento. Em resposta, o TJCE informou que, por motivo de segurança, os juízes das áreas de Execução Penal e Criminal não concedem entrevistas.
Em nota, o órgão resumiu a explicação sobre as condições em que se pode aplicar o monitoramento eletrônico.
Conforme o Tribunal, “o juiz pode definir a fiscalização por monitoramento eletrônico quando houver concessão de liberdade ou prisão domiciliar em Juízo de Custódia ou Juízo de Execução Penal”. O juízo atua quando há concessão de prisão domiciliar, estudo ou trabalho externo e saída antecipada. Já o juízo de Custódia é quando a prisão preventiva é substituída por prisão domiciliar e aplicação das medidas alternativas previstas no Código Penal.