O plenário do STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu, que empresas podem celebrar acordos individuais de corte de salário e redução de jornada de trabalho com empregados, conforme medida provisória editada pelo governo de Jair Bolsonaro.
Os ministros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e o presidente da corte, Dias Toffoli, votaram para manter a validade da MP.
Assim, ficou definido que os acordos têm efeito imediato e não podem ser alterados pelo sindicato da categoria, independentemente de futura negociação coletiva. Com isso, o Supremo derrubou a decisão liminar (provisória) do ministro Ricardo Lewandowski. Relator do processo, ele havia determinado que as tratativas diretas entre patrão e trabalhador tinham vigência imediata, mas dava a opção de adesão a acordo coletivo posterior que fosse mais benéfico.
Divergência
Os ministros Edson Fachin e Rosa Weber também divergiram da maioria, mas foram além em relação ao relator e defenderam a declaração de inconstitucionalidade da norma. Ficou mantida apenas a exigência da MP para que o sindicato seja comunicado do acordo em 10 dias, mas sem poder para invalidá-lo.
A medida é um dos pontos do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda lançado pelo Executivo federal e permite também a suspensão de contrato de trabalho. Além disso, estabelece que o corte salarial tem que ser proporcional à redução da jornada de trabalho e pode durar até três meses.
A empresa também tem de se comprometer em garantir a estabilidade no emprego por mais três meses após o fim dos efeitos do acordo. O ministro Alexandre de Moraes foi o primeiro a divergir de Lewandowski. Ele afirmou que, ao dar a opção de adesão posterior a acordo coletivo, a decisão descaracterizou a norma editada pelo Executivo.
Moraes destacou que o acordo individual em meio à calamidade pública é constitucional e constitui ato jurídico perfeito, ou seja, tem todas as consequências imediatas e não podem ser alteradas pela entidade de classe. Segundo o ministro, o trabalhador terá a opção de recusar a proposta empresarial. “Obviamente, será uma opção do próprio empregado. Ele pode não aceitar essa redução proporcional. É uma opção lícita, razoável, proporcional que se dá ao empregado. Ele tem o direito de querer manter o seu emprego”, disse.
“Essa MP pretendeu e conseguiu compatibilizar valores sociais do trabalho com a livre iniciativa, ou seja, mantendo mesmo que abalada, a saúde financeira da empresa e o emprego”, afirmou Moraes. Fux foi na mesma linha e disse que a Constituição não dá poder para a entidade de classe interferir em tratativas individuais feitas por trabalhadores com seus empregadores.
“O sindicato não pode fazer nada, absolutamente nada que supere a vontade das partes, porque desde priscas eras a transação extrajudicial tem força de coisa julgada. E ainda que possa ser rescindível, só pode ser rescindível pelas pessoas que participaram dessa transação”, afirmou.
Fachin, porém, abriu uma nova corrente e votou para dar ainda mais poder aos sindicatos em relação à decisão de Lewandowski. O ministro afirmou que o trecho da MP do governo deveria ser anulado e disse que não pode haver negociação individual, apenas coletiva, que determine redução salarial.
“Não há espaço para conformação legislativo supressora da convenção ou da negociação coletiva e, no particular, a Constituição, ao estabelecer a participação obrigatória do sindicatos para validade do processo negocial, é reforçada pelas normas da OIT (Organização Internacional do Trabalho), que foram internalizadas no ordenamento jurídico brasileiro”, disse.
Resguardo
Para o ministro, o sindicato não pode ser excluído da negociação. “A exigência de que a flexibilização de direitos fundamentais sociais, tais como salários, jornadas ou a continuidade do próprio contrato de trabalho, seja feita sob o olhar protetivo do respectivo sindicato da categoria, tem a função de resguardar o empregado”, disse.
A ministra Rosa Weber acompanhou Fachin e chamou a atenção para uma possível sobrecarga da Justiça. “Em tempos que reclamam por simplicidade, uniformidade e confiança, a arquitetura criada pela medida provisória em verdade, estimula o conflito social e consequentemente a sua judicialização. E deixam desprotegidos exatamente os trabalhadores mais vulneráveis à informalidade”, disse.
Congresso
Barroso, por sua vez, acompanhou a divergência inaugurada por Moraes. Para ele, nesses casos, o mais adequado é a autocontenção do Judiciário. O ministro destacou, ainda, que se trata de uma MP que ainda será submetida à apreciação do Congresso. “Ainda haverá acerca da medida juízo político a ser feito pelo órgão de representação política do país, inclusive, com margem de negociação e atenuações daquilo que esteja previsto”, disse.
Além disso, Barroso questionou a capacidade dos sindicatos brasileiros para participarem de todas as negociações no país. “A grande heterogeneidade de sindicatos e suas múltiplas deficiências que todos nós reconhecemos exibem, de forma muito visível, uma incapacidade para realizar, a tempo e a hora, no volume que se exigirá, com proficiência e probidade, a chancela de milhões de acordos de suspensão de contrato ou de redução de jornada.”
O ministro Gilmar Mendes acompanhou a maioria e disse que o Supremo precisa levar em consideração as consequências econômicas do novo coronavírus. “Importante que nós reconheçamos que o direito constitucional de crise não pode negar validade a essa norma, sob pena de, querendo proteger, matar o doente. E os doentes aqui são muitos, são as empresas, o sistema produtivo e os trabalhadores.”
Nordeste Notícia
Fonte: Diário do Nordeste