As autoridades cearenses continuam a praticar a estratégia de enviar presos com liderança dentro de organizações criminosas para outros estados do País. Meses após a mudança de detentos ligados a outras facções, onze chefes do Primeiro Comando da Capital (PCC) foram levados à Penitenciária Federal de Segurança Máxima de Mossoró, no Rio Grande do Norte, na madrugada de ontem (25).
Familiares se surpreenderam com a transferência horas depois, quando chegaram ao Centro de Detenção Provisória (CDP), em Itaitinga, para realizar a visita íntima, e foram informados por agentes penitenciários que os detentos tinham sido levados a uma unidade penitenciária federal que fica a cerca de 250 Km de Fortaleza, conforme apurado pela reportagem.
Não houve aviso prévio aos parentes nem aos advogados. Questionada sobre as transferências, a Secretaria da Administração (SAP) não emitiu posicionamento.
Foram transferidos Erivando Paulino de Sousa, Francisco Arielson de Sousa, Francisco Eudes Martins da Costa, João Wanderson dos Santos Sousa, José Fabiano Nunes de Alencar, Leandro de Sousa Teixeira, Leonardo Santos Bezerra, Manoel Giliarde da Silva, Marcílio Alves Feitosa, Marco Aurélio Flávio e Paulo César da Costa Souza.
Os onze internos fazem parte de um grupo de 33 homens com perfil de liderança dentro do PCC, que denunciaram, através de ação judicial interposta no Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), terem sofrido tortura de agentes penitenciários, enquanto estavam isolados na Casa de Privação Provisória de Liberdade Professor Jucá Neto (CPPL III), também em Itaitinga, na madrugada de 20 de fevereiro deste ano, antes de serem levados para uma ala de segurança máxima do CDP.
Os presos teriam sofrido ferimentos nas mãos, nas costas e na cabeça provocados por agressões de servidores públicos. Os laudos dos exames de corpo de delito, realizados pela Perícia Forense do Ceará (Pefoce), confirmam as lesões, sendo algumas delas cometidas por instrumento contundente. Os peritos, entretanto, não tiveram elementos suficientes para garantir que houve tortura.
Questionada pela reportagem na época em que a denúncia dos internos veio à tona, em março último, a SAP garantiu que “repudia e não permite qualquer ato que possa violentar a dignidade das pessoas presas em nossas unidades” e rebateu que, durante o período de transição que o sistema penitenciário cearense vivenciou neste ano (entre janeiro e fevereiro, início da nova gestão), “houve amotinamento e agressão física contra nossos agentes, por parte de um pequeno grupo de presos ligados ao crime organizado, que foi legalmente contido por nossos servidores”.
Perfil
Os internos transferidos para o presídio de Mossoró respondem a crimes como homicídio, latrocínio, tráfico de drogas, lavagem de dinheiro, roubo e receptação.
Leandro de Sousa Teixeira, por exemplo, criou uma espécie de ‘filial’ da facção Primeiro Comando da Capital em Caucaia e foi um dos alvos da Operação Saratoga, deflagrada pelo Ministério Público do Ceará (MPCE) e pela Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), em dezembro de 2017, para desarticular esquema criminoso de liberação de suspeitos detidos – que tinha a participação de um delegado, preso na investigação.
Marcílio Alves Feitosa, o ‘Tranca’, iria passar por uma cirurgia nos dedos fraturados pela suposta tortura. Ele é considerado o chefe de um braço do PCC especializado no tráfico internacional de entorpecentes, que trazia droga do Paraguai para o Ceará, por helicóptero. ‘Tranca’ foi capturado junto de comparsas durante o transporte de cocaína, em um cerco feito pelas polícias Militar e Federal, em Acopiara, em julho de 2012.
Facções
O Estado utilizou a transferência de líderes de organizações criminosas para presídios federais como uma estratégia para inibir a maior série de ataques a prédios públicos e privados e ônibus da história do Ceará (foram mais de 200 ocorrências, ordenadas principalmente de dentro dos presídios), registrada em janeiro deste ano, e retomar o controle do sistema penitenciário.
Pelo menos 40 detentos, ligados às facções Comando Vermelho (CV) e Guardiões do Estado (GDE), foram levados a presídios federais. Quanto ao PCC, as autoridades preferiram, no primeiro momento, apenas isolar os presos em alas de segurança máxima de unidades estaduais.