Distante da tensão dos presídios, Luís Mauro Albuquerque Araújo, 49, fala com tranquilidade sobre o cenário que encontrou no Ceará quando foi nomeado secretário da Administração Penitenciária, em janeiro último. Sem alterar o tom de voz, sorrindo por diversas vezes, ele disse discordar de quem o considera o personagem central da crise que se instalou na Segurança Pública do Estado logo após ser empossado.
Nesta entrevista, Mauro detalha o acerto que o permitiu integrar o secretariado cearense, o novo pedido de reforço a Sérgio Moro e a não transferência de membros do PCC para presídios federais. Destaca ainda a ausência de mortes no sistema e a reformulação do modelo de visitas nas unidades, incluindo as íntimas. Por fim, o secretário nega a possibilidade de colapso por superlotação. “Colapso estava quando eu cheguei”, argumenta.
O POVO – O que o senhor fazia antes de entrar para a área da Segurança Pública?
Mauro Albuquerque – Eu era moleque (risos). Tinha 17 anos. Entrei com 18 anos para a Polícia Militar do Distrito federal. Fui dispensado do Exército. Fiquei de 1987 a 1994. Depois, passei para a Polícia Civil, também do DF, que era quem tomava conta das unidades prisionais, no sistema. Passei no cargo de agente de custódia. Meu último cargo na Polícia Militar foi a Companhia de Operações Especiais. Não existia Bope. Na Civil, a gente começou a fazer um trabalho, quando chegou ao sistema, de criar procedimento, rotinas carcerárias, recaptura de foragidos, e fomos avançando nesse ponto até 2000, quando criamos a primeira unidade de operações especiais do País, que era a Diretoria Penitenciária de Operações Especiais (DPoe). Fiquei à frente da Dpoe durante 15 anos, quando a gente implementou uma doutrina e exportou essa doutrina, dando treinamento no País todo. Em 2004, eu estive no Rio de Janeiro. Passei 21 dias no complexo de Bangu. Fomos treinar o primeiro grupo de operações especiais deles, o GIT, Grupamento de Intervenções Táticas. Enfrentamos, em quatro dias, três rebeliões. Ficou bem demonstrado que a técnica funcionava. Na primeira, eram 1.100 presos rebelados no pior tipo de estrutura que pode existir para você enfrentar uma crise, que é na vertical. Três andares, cinco reféns, arma de fogo. Tudo que pode tornar uma situação muito crítica tinha lá. E conseguimos resolver em meia hora, sem nenhum refém morto ou preso morto. E essas rebeliões, não era que eu fosse pé frio, não. No Rio, até ser criado o grupo, tinha até 23 rebeliões por ano. Fui pra Portugal também, dar treinamento para um grupo tático que atua no País todo. Demonstramos a nossa técnica e eles adotaram. Então, a gente vem trabalhando. Hoje, a gente deve ter na faixa de 6 a 7 mil pessoas treinadas em curso de intervenção.
OP – O senhor falou que a estrutura vertical é a pior. Mas o governador do Rio, Wilson Witzel (PSC), tem planos de construir uma unidade vertical, também em Bangu…
MA – Isso aí é… Assim, melhor horizontal. Quando você perde uma estrutura vertical, se torna uma fortaleza total. Horizontal já é difícil, imagina vertical. É como se fossem três unidades, uma em cima da outra. Vira um castelo.
OP – Então, o senhor não recomenda.
MA – É mais difícil. Em 2016, quando a gente retomou aqui (Ceará) algumas unidades, Carrapicho (Caucaia), CPPL I (Itaitinga), teve essa dificuldade. São dois andares. Térreo e primeiro andar. Então, já dificulta um pouco. Então, tem toda essa situação.
OP – O senhor chegou a fazer curso superior ou já ingressou direto na carreira?
MA – Sou formado em Segurança Pública pela Universidade de Santa Catarina e tenho até o 8º semestre em Direito. Tive que trancar por conta das viagens. Não tive como terminar porque passava grande parte do tempo viajando.
OP – E depois do Dpoe?
MA – Fui para a Divisão de Operações Especiais da Polícia Civil, na parte de ensino e treinamento, cumprindo mandados de prisão e apoio às delegacias. E continuamos viajando para dar treinamento ao pessoal. Estive no Ceará, em 2016. Em 2017, fomos para Alcaçuz (RN). O ministro Alexandre Moraes (à época, da Justiça) determinou a retomada. Eles (presos) estavam há 14 dias rebelados. E a gente foi para lá, e me chamaram para ir coordenando a força. Tinha 12 estados juntos. E a gente retomou. Depois, o então governador do Rio Grande do Norte (Robinson Faria – PSD) me convidou para assumir a secretaria, fez o desafio e a gente aceitou. Ele me deu as condições, eu precisava de carta branca para trabalhar. O sistema é sensível, você tem que escolher seu time, colocar a doutrina para funcionar e não pode ter político. Tem que ser técnico. Então, ele deu a carta branca e a gente começou a trabalhar, quebrar alguns paradigmas, mostrando que o Estado é quem manda, que preso é preso, que não se negocia com preso, porque se tiver bom pra ele, está ruim para o Estado, está ruim para a população. Então, a gente começou a colocar em prática e mostrar que a doutrina não é só ordem, colocar ordem e disciplinar. Isso é só o princípio. A doutrina vem com você colocando, dando o que é de direito e cobrando o que é de dever, no rigor da lei. Então, a gente vem trabalhando em cima disso.
OP – O senhor deixou a família no DF. Foi por segurança? É mais fácil trabalhar assim?
MA – Prefiro. Isso me dá mais liberdade para trabalhar. Estou trabalhando na faixa de 18 a 20 horas por dia. Então, se estivessem aqui, eu teria que dar atenção. É melhor. E eu ainda nem comecei a viajar. Era para eu estar viajando pelo Interior, mas, devido aos ataques, a gente teve que concentrar mais aqui na Capital.
OP – Como foi a articulação que o trouxe até aqui? O primeiro contato foi com o governador?
MA – Não, não. Foi da Casa Civil. O professor Élcio Batista ofereceu para que eu viesse. No começo, eu fiquei meio em dúvida porque eu já tinha acertado com a governadora do Rio Grande do Norte (Fátima Bezerra – PT) a permanência. Daí, eu falei para eles negociarem, para os dois governadores conversarem. E aí a governadora aceitou. Meio a contragosto, mas aceitou. Deixei meu secretário-adjunto lá, o Maiquel Anderson (atual secretário-adjunto da Justiça no RN), responsável pelo sistema penitenciário. Ela que o convidou porque senão ele teria vindo junto comigo também. A gente fez esse acordo. Ele ficou lá porque estava estabilizado e eu vim para cá.
OP – E a sua conversa com o Camilo, também foi em dezembro?
MA – Sim. Conversei uma vez por telefone e conversei com ele pessoalmente. Vim antes da posse para gente acertar os detalhes. E ele me deu carta branca. Senti que ele estava disposto ao enfrentamento e até hoje tenho visto que ele está empolgado em realmente resolver a situação. Então, isso é importante.
OP – O senhor trouxe mais quantos da sua equipe?
MA – Trouxe cinco ou seis para cargos de confiança.
OP – Para quais cargos, diretoria de unidade?
MA – Não. Na diretoria de unidade vamos deixar só agentes penitenciários. A minha equipe é mais para assessoria. Na direção de unidade, eu não teria tanta mobilidade. Na assessoria, tenho mobilidade com eles para poderem viajar, treinar o pessoal, capacitar, fiscalizar, implementar. Toda essa dinâmica que a gente precisar para colocar a rotina e a doutrina, definitivamente, no sistema.
OP – Desde a sua chegada, a diretoria de alguma unidade foi mudada?
MA – Não. Até agora, não. Eu costumo observar para depois mexer. Se estiverem produzindo…
OP – O senhor se considera o personagem que deflagrou essa crise?
MA – (Risos) É até cômico porque eu vim para prestar um serviço, trabalho. Agora, não vim para agradar. Trabalho dentro da lei. Estou aqui para combater o crime. Vivo a minha viva toda combatendo o crime. Então, não me considero o pivô, não. Agora, se eles quiserem me considerar o pivô, não estou preocupado com isso, não. Se eu estou incomodando os bandidos, estou no caminho certo.
OP – Efetivamente, o que mudou no sistema depois da sua chegada?
MA – Quando recebi o convite, observei o ambiente para me orientar e decidir agir. Então, logicamente, comecei a fazer alguns levantamentos de longe. Eu fiz um cálculo e deu outro resultado, só que para melhor. Eu não imaginava. Eu tenho cento e tantas unidades prisionais. E aí você começa a ver a questão de cada unidade prisional. E aí você tem um agente de plantão em cada unidade, e 70, 80 100 presos. Aí, vai para as unidades prisionais e não tem estrutura. Não tinha. Eram casas alugadas com preso dentro. Não tinha ambiente. Cadeia fazendo fundo com escola. Parede da cela que dá na rua, que o esgoto não suporta. Cadeia que não tinha nada. Então, quer dizer, as cadeias eram um faz de conta. E isso ajuda muito ao crime, a estrutura do crime. Se você não tem o controle sobre a situação, fica fácil para eles. Foi o que a gente observou. E com os ataques, eu imaginava fechar 50 a 60 cadeias em um ano, e a gente já fechou 95 unidades prisionais em trinta e poucos dias. Reestruturamos, tiramos a força do crime das regiões e mostramos que o Estado manda. Acabei a comunicação quase que total do crime. Começaram os ataques, no mesmo dia, quando recebi a primeira notícia de ataque, a gente começou a retirar os presos, à noite, as lideranças, e concentrar num único ambiente. Então, começamos a intervir em algumas unidades. Autuamos mais de 500 presos que tentaram intervir contra o Estado. Não perdemos nenhuma cadeia. Estamos em janeiro sem nenhuma morte dentro do sistema penitenciário. Estamos com seis unidades sem visitação. Coisa que antes o sistema caía se acontecesse. Manifestação das mulheres passou a ser pacífica, porque eu falei que, se houvesse alguma coisa, minha inteligência iria levantar e fotografar. E ela não teria a visita suspensa, ela seria proibida de entrar no sistema penitenciário. E se entrasse com determinação judicial para visitar, eu recorreria. E, se preciso fosse, transferiria o marido dela para outra unidade, mostrando que o Estado não ficará refém à situação do crime. A gente sabe que quem sofre é o visitante, mas o preso usa o visitante para fazer pressão sobre o Estado.
OP – Quando o senhor fala em manifestação pacífica, a que se refere? Sem queima de pneus?
MA – Sem, sem. Coisa pacífica, tranquilo. Elas fizeram uma manifestação aqui, que queriam e queriam… Recebi uma comissão delas aí. E na próxima já passei para o atendimento individual. Ou seja, tinha 200, eu falei que atenderia uma a uma. Não tinha problema. Só não atenderia grupo para não ter simbologia de organização. E aí não quiseram. Ou seja, elas não queriam resolver problema, queriam fazer pressão. E se tem uma coisa que eu não funciono é na pressão. Então, foi muito trabalho. A gente reagrupou os agentes, estou comprando equipamento, porque tínhamos uma deficiência muito grande. Chamamos, o governador autorizou a chamar, 440 agentes. Estão em treinamento. Os agentes antigos estão sendo treinados também. Uma turma por semana. Enquanto houve a crise, a gente estava trabalhando na estruturação do sistema. Meu modo de trabalhar é atacar várias frentes ao mesmo tempo. E, se aparecer a demanda, a gente resolve também. Não sou muito adepto de ‘teve gargalo aqui’. Temos que nos virar e resolver a questão.
OP – Quais são as unidades que estão sem visitação?
MA – CPPL I, III, IV, IPPOO 2, Professor Sobreira Amorim e Carrapicho, além da cadeia pública de Sobral, porque teve uma fuga durante a visitação. Isso mostra o quanto é nocivo ter visita dentro de cela. É uma forma que a gente vai mudar.
OP – As visitas íntimas acabaram?
MA – Não é que acabaram. Estou remodelando a situação. E se necessário for, eu vou acabar. É uma regalia. Não está na lei. Eu não sou obrigado a dar visita íntima ao preso. E se criou como se isso fosse um direito absoluto. E não é direito. Tem a visita íntima e a visita social. Na visita íntima, há um encontro sexual. E a visa social é com os parentes. Antes, entrava visita e fazia sexo dentro da cela, na frente dos outros, na frente de crianças. Então, pornografia total. E isso a gente vai acabar. Isso é básico.
OP – Como se davam essas visitas no aspecto do controle das facções?
MA – Era como as facções ganhavam dinheiro. Muitas pessoas eram estupradas com a desculpa que estavam pagando dívida do parente que estava preso. Então, havia uma exposição desnecessária de mulheres e crianças dentro do sistema penitenciário. E o Estado é responsável por isso. Então, a gente está reestruturando a visitação. E nos casos em que a unidade não me dá problema, está dentro da disciplina, está indo para a escola, a gente vai abrir essa concessão. Agora, vamos ver a forma de fazer isso. O Brasil é um dos poucos países do mundo que têm encontro íntimo dentro de unidade prisional.
OP – E como o senhor pensa em fazer isso?
MA – Têm várias situações. Por exemplo, seguir a Lei de Execuções Penais. Se a preso está ali, não deu problema nenhum em seis meses, então ele vai ter direito à visita dele, o encontro íntimo dele. Se ele der problema, são seis meses suspenso e a gente vai analisar.
OP – Onde e quando seria a visita íntima, continuaria no horário da visita?
MA – Não, não. Seria uma visita específica, agendada, em local adequado. E isso vai levar algum tempo porque a gente tem que estruturar algumas unidades que não têm esse ambiente. A gente está reformulando e adaptando a unidade à situação. Mas isso também não é prioridade, não. Prioridade é educação, visita segura. É como o caso das gestantes, que a gente tem um grande problema porque, até os três meses, não pode passar pelo body scanner. E todo mundo fica grávida. Então, para resolver isso basta uma medida simples: a gente vai colocá-la num ambiente específico, separado, mais limpo e controlado, para ter uma visita social. Quando as grávidas forem embora, a gente pega ali os presos e passa eles pelo body scanner. Simples.
OP – E com relação às crianças?
MA – Faremos como no Rio Grande do Norte, na visita kids. Teremos alguns espaços que sejam próprios para as crianças. Não quero colocar criança mais dentro de pátio, colocar criança mais dentro de cela. Para ela entrar na cela e ter a visualização de que aquilo é comum. Futuramente, vai virar meu ‘cliente’, porque se torna um produto do meio. A gente tem que acabar com essa situação. Termos um ambiente de criança, controlado, que eu traga o preso, depois trago a criança, depois a criança vai embora e eu trago o preso e passo ele pelo body scanner novamente.
OP – E com relação à rotina dos presos, esse trabalho deles limpando as unidades ocorria antes?
MA – Ocorria de certo modo, porque o preso quer trabalhar. O problema é que o crime organizado não deixava ele trabalhar. Quando você coloca o preso para trabalhar, ele começa a desgarrar do crime. Deixa de ser escravo do crime. Aumenta a esperança dele, porque ele começa a trabalhar. A remir a pena dele. Três dias por um. Temos vários projetos em que o preso trabalha e recebe. Tem o egresso que está trabalhando e recebendo. A gente consegue fazer toda uma dinâmica com o preso. E o que é que a facção faz? Não quer que a pessoa trabalhe. Quando cheguei aqui, muitos diretores falaram: ‘não, eles não vão deixar trabalhar’. E hoje todo mundo trabalha feliz da vida. Por quê? Porque a gente fez essa operação. Tirei os ‘cabeças’ e estou tirando os braços dele, que são aqueles caras que fazem. Então, trabalho em duas frentes aqui: separar quem é criminoso de quem quer mudar de vida, lógico, seguindo um regramento. O Estado não negocia. Nisso eu sou intransigente. Eu não negocio, não faço acordo. ‘Ah, nós estamos de boa’. Não está fazendo nada mais do que a sua obrigação. Isso aí é bem básico. A gente consegue disciplinar e colocar o pessoal para trabalhar. E a lei mesmo fala que o ambiente e a higiene são de responsabilidade do preso. Então, no ambiente dele, ele tem que trabalhar. Tem que limpar, tem que manter LIMPO! Se estiver sujo, ele vai ter que responder por isso. Se uma parede for riscada, ele vai ter que limpar, senão ele vai ser responsabilizado por dano ao patrimônio. É cara uma pintura. A gente está reformando e as paredes aqui eu quero manter o padrão que deixei no RN. Não tem um risco na cela! Cadeia não tem que ter cheiro de cadeia. Cadeia não tem que ser chiqueiro porque não é porco quem está preso lá e muito menos é porco quem trabalha lá. Tem que ser uma coisa realmente digna. E dignidade começa por limpeza. Já dizia a minha mãe: ser pobre não é defeito. Agora, ser porco, é vergonha.
OP – E os procedimentos de contato com os presos, revista constante, já estão em prática?
MA – Em algumas situações, sim. Estamos trabalhando na parte de reestruturação. Preciso reestruturar as unidades para isso. A gente trabalha com contato zero. Então, se eu e você quisermos revistar uma unidade inteira, a gente revista tranquilo. Vai demorar mais? Vai. Mas a gente está totalmente seguro, atrás das grades. Tenho contato zero. Está sendo feito isso em grande parte das unidades, nas maiores e nas que estão controladas.
OP – Qual era o cenário antes?
MA – O grande problema aqui é que estava muito sujo. Você não imagina o tanto de lixo! Já assistiu aquele programa ‘Acumuladores’? Era mais ou menos aquilo. E isso é da técnica do crime. Eles usam a sujeira para poluir o ambiente e você não encontrar nada, ficar com nojinho de meter a mão dentro do vaso. Entope e tal. E isso a gente quer acabar. E o grande excesso de coisas que entrava. Se você imaginar o que a gente tirou de lixo e está tirando. Nas primeiras revistas, das primeiras semanas, foi só para tirar lixo. Não sei de onde sai tanto lixo. Vi até o vídeo de um parente lá, querendo achar alguma coisa: ‘tão jogando tudo fora, dos presos’. E procurava, procurava… Mas a gente usa um método de catalogar todos os ventiladores arrumados, televisões, colchões. Mas a bandidagem usa as seguintes situações: primeiro, ela tenta te corromper. É o primeiro passo. Segundo, ela tenta te intimidar. E terceiro, tentam desacreditar o teu trabalho. De repente, todos os lobos viraram ovelhas. Todo mundo é ovelhinha. O agente agora bate nele o dia todo, a noite toda. É incrível como muda o ambiente. A gente trabalha em cima da legalidade. E quando tiver que usar a força, nós vamos usar. É igual eu falo para o preso: se enfrentar o Estado, a gente vai passar por cima. Vou usar a força necessária. Lógico, a força diferencial. Uma vez eu falei isso numa audiência pública e tentaram me processar porque eu estava incentivando a violência contra o preso. Como é que é? É incrível como as pessoas conseguem tentar deturpar o teu trabalho. Eu estou falando que eu uso a força, se necessário for. E vou usar a força suficiente para neutralizar a ação dele, porque eu não vou sair, com 50 anos, na porrada, ou falar para os meus agentes estarem saindo na porrada com preso de 20 anos, lutador. Então vou usar os meios que eu tenho, os treinamentos que nós temos, para conter a situação. Mas quando a pessoa enfrentar o Estado, ela vai responder por isso também. E se ela se machucar, antes de ela responder, vai ter o atendimento médico, vai ser autuada, vai ter o corpo de delito e vai responder por aquilo. Isso acaba com aquela sensação de impunidade que o preso usa muito: ‘Ah, não tenho nada a perder…’. É quase um imortal. Então, ele faz isso para justamente para intimidar o Estado e depois se colocar na posição de vítima para poder fazer com que desacreditem todo aquele trabalho que você está fazendo.
OP – O senhor atribui à tentativa de descrédito as denúncias de maus tratos não confirmadas?
MA – É lógico! É mais uma técnica que eles usam. E é bem articulado, usa pessoas, usa fatos, o MP entra nas unidades que estão com procedimento em andamento, com intervenção dentro, o Judiciário, a OAB. Eu fico triste quando entram pessoas lá e dizem: ‘nossa, eles estão se colchões na cela!’. E os colchões todos lá no pátio, arrumadinhos. Cara, eu tenho que revistar! Para você ter uma ideia, todos os presos, nesses últimos dias, eles passaram por atendimento de vacinação e passaram por tratamento de escabiose. E para eu tratar a escabiose (sarna), para quem não sabe, a primeira coisa que eu tenho que retirar é o colchão. Não adianta aplicar o remédio e deixar o colchão. E eu tenho que deixar esse colchão na faixa de oito a dez dias sem contato humano. Não precisa ser no sol, não. Mas sem contato humano, que é para exatamente acabar com a doença que está ali. Aí, depois, eu posso devolver novamente para o preso. Aí, coloca-se assim como se fosse uma prática de tortura. É incrível como algumas pessoas tentam direcionar. É lógico que, muitas das vezes, é interesse do crime. Por isso que eu gosto de ser fiscalizado por pessoas que realmente tenham um compromisso com a verdade.
OP – Qual a sua real pretensão sobre rever a divisão dos presos por facções?
MA – A unidade é do Estado. Isso tem que ficar bem claro. Eu vou colocar o preso onde ele deve ser colocado. Se vai ter alas de uma facção ou outra, que nada mais é que um seguro, porque a partir do momento em que o preso está dentro de uma unidade e ele não pode conviver com outros, ele está no seguro. Vamos colocar uma ala de A, de B, de C. Não interessa. É do Estado. A gente já está preparado para isso e já tem alguns locais que estão na situação.
OP – Então, já há unidades abrigando presos de facções diferentes, em alas separadas, depois da sua posse?
MA – Tem, sim. Isso é paulatinamente. Tenho que reestruturar toda a unidade, estou movimentando os agentes, ainda. Treinando os agentes. Não é uma coisa inconsequente. É uma coisa bem consciente e planejada.
OP – E qual é essa unidade, pode dizer?
MA – Não! (risos) E você sabia qual era minha resposta. Mas o não você já tinha.
OP – O governo demorou a retomar essas unidades após a divisão? Está fazendo em um mês o que não foi feito em dois anos…
MA – Não, não é questão de demorou. Tem um planejamento. Vou tirar por 2016, quando deixaram destruir as cadeias. Perderam muito tempo reformando uma coisa que entregaram e deixaram destruir. E uma coisa que você não deixa destruir é cadeia. Os únicos prejudicados com isso são o Estado e o agente penitenciário. Você entrega uma cadeia, reformada, nova, com uma estrutura e deixa o preso destruir… Inclusive, dano ao patrimônio, dentro do gerenciamento de crise comum de rua, não é uma situação crítica. Mas, dentro de um presídio, é. Porque se quebrar uma cadeia, aonde eu vou custodiar o preso? E é o que eu tenho dito para os presos: não quebrem! Porque, se quebrar, não ficará solto. Se quebrar uma rua, eu vou que colocar esse pessoal em outro lugar, e vai ter que ser onde tem gente. Então, quer dizer, eu vou dobrar a capacidade da outra cela. Se quebrar, vai continuar preso. Então, eu falo: não quebre o seu patrimônio. Se quebrar, vai morar com mais gente. Antes, quebravam, e chega a ser cômico, eles diziam: ‘fizemos uma rebelião para melhorar as nossas condições’. A primeira coisa que eles quebram: cozinha, sala do dentista, enfermaria. Ah, por favor… Melhorando? Poderiam quebrar qualquer coisa, menos o ambiente deles. Então, realmente, o interesse do crime organizado, quanto pior, melhor. Quanto menos controle se tiver, melhor. Então, isso acabou no Estado do Ceará.
OP – Com essas unidades fechadas, quantos presos foram movimentados?
MA – Na faixa de 3.500 presos, trazidos para a Capital, Região Metropolitana e distribuídos no próprio Interior. E tem uma vantagem também: a gente conseguiu colocar 460 na tornozeleira, só em janeiro, que estavam no regime fechado, e eram do semiaberto. E vamos fechar na casa dos 780 presos na tornozeleira só no Interior. Já está em andamento e só faltam as audiências. Somente os presos que estavam nas unidades que foram fechadas no Interior. Eles nem vieram, já foram para a tornozeleira. Faltam 320. Todos já têm condições de estar em liberdade, no convívio com a família, e a grande vantagem é que a gente tem o controle dele. Ele está monitorado. Muitas vezes, no semiaberto, tem o problema da pessoa sair, passar o dia todo sem fazer nada, voltar à noite e você não saber onde ela esteve durante o dia. E agora você tem o raio-x e fica fácil do Judiciário fiscalizar o cumprimento da pena. É muito importante e dá uma real oportunidade para a pessoa não voltar mais para o sistema. Mas, se quiser voltar, a gente cuida.
OP – Como fazer para evitar um colapso do sistema com a quantidade de presos que está vindo?
MA – Colapso de quê?
OP – Do sistema, com a superlotação das unidades…
MA – Mas aí é um engano. Isso é um engano. Colapso estava. Estamos acabando com o colapso que tinha. Nós tínhamos cento e tantas unidades que não era lugar de se colocar um ser humano. Eu estou arrumando o colapso que estava. O grande engano é a pessoa achar que eu concentrar pessoas num local vai colapsar. E o problema não é esse. O problema é que, vamos supor, eu tinha uma unidade com 70 presos. E ela não tinha esgoto, não tinha banho de sol, não tinha atendimento médico, não tinha assistência jurídica, isso é colapso. Agora eu peguei essas 70 pessoas, coloquei com mais 70 pessoas, ou com mais 1.000 pessoas, e consigo dar atendimento, todo mundo vacinado. Imagina a população de um bairro com todo mundo vacinado. Tem? Não tem. E de forma maciça. Todo mundo tratado. Assistência jurídica. Nós estamos com um mutirão, coloquei 36 advogados da secretaria para revisar todos os processos, junto com a Defensoria. A Defensoria Pública só vai fazer o papel de fazer a petição. Vamos deixar tudo pronto. Eles vão passar por todos os presos do sistema. Cada unidade, uma semana. Independentemente da quantidade de presos que eu tenho lá. Então, quer dizer, isso é colapso? É a mesma coisa que fiz no RN. Quebrei o paradigma que o problema de cadeia não é a quantidade de presos que eu tenho lá. É o tipo de situação em que eles estão. A gente está mostrando que tem mais gente dentro da unidade e está tratando o preso com dignidade e conforto, inclusive, e com mais segurança, que eles não tinham. E muitos presos agradecem. O preso agradece. ‘Secretário, agora eu estou liberto. Porque, antes, eu não estava’. Antes, o cara pegava ele dentro da cela, a família era explorada, o cara parava o caminhão na casa dele para pagar dívida, levava televisão, geladeira, fazia e acontecia. Por último, a família era expulsa. Quando a casa era própria, era expulsa do local.
OP – Há informações sobre o comércio de alimentos levados pela família dos presos. Procede?
MA – Levados para a firma! Tinham supermercados dentro das unidades. Tudo isso! Até o miojo que a gente pegava era do mesmo lote. Até em unidades diferentes a gente conseguiu ver o mesmo lote de macarrão, para se ter uma ideia.
OP – Proibir a entrada de alimentos é uma forma de atacar as finanças das facções no sistema?
MA – A facção não bota dinheiro dentro da unidade prisional. Ela tira dinheiro de lá. Porque ela ganha dinheiro. A gente costuma dizer que tem o ‘cliente cativo’. É uma escravidão. É como trabalho escravo. O cara chega e diz: ‘você vai trabalhar comigo e tudo vai comprar na minha mercearia aqui’. Então, você não vai pagar a dívida nunca. É a mesma coisa. Drogas, celulares, prostituição, aluguel de cama. Muitas vezes a gente movimenta um preso nas alas, de um lado para o outro, para não ter essa fixação. Quando cheguei aqui, em 2016, o pessoal perguntava: ‘quando é que eu vou voltar para a minha comarca?’. Sua? Não, não. Ô! Te enganaram aí! Não acredito que você comprou da facção. E comprou! O cara pagou R$ 5 mil pela cama! Cama para dormir! E eu perguntei: cadê a nota fiscal? Não tem? Porque eu tenho. Tá aqui! Não é sua, é nossa. Do Estado. É minha. E aí você vê que tudo é comércio. A televisão! Até as televisões eram parecidas. As televisões eram alugadas. Sua família trazia, você preso, e para ela funcionar, você precisava pagar R$ 50 por semana. Ventilador, do mesmo jeito. Tudo isso era comércio. Imagina uma unidade com mil presos. Imagina quanto num dia. Nós já tiramos numa faixa de três mil e poucos celulares.
OP – Já tem um numero atualizado de celulares recolhidos?
MA – 3.200. Agora você imagina o quanto de informação não tinha nesses celulares que a gente distribuiu entre as agências de inteligência, através do Ministério Público. Tudo está indo para o Ministério Público. Tudo está canalizado, igual aconteceu quando estive aqui. E, daqui a um ano, ainda vão estar prendendo gente devido às informações nesses celulares apreendidos. E aí você imagina três mil celulares, por baixo, R$ 1.000 cada um. E a gente sabe que não é isso o valor de um celular. Só aparelho tem de R$ 4 mil, R$ 5 mil. Então, quer dizer. Tem aparelho que o meu não chega nem perto… São coisas que você combate. E quando você corta o fornecimento, de onde eles tiram dinheiro, melhora bastante. Você consegue, realmente, combater. Estamos trabalhando em cima disso.
OP – E quais dessas unidades possuem body scanner? Todas as grandes possuem?
MA – Todas. E as de médio porte a gente está providenciando para que tenham também.
OP – Então, como esses celulares entram? Em 2016, o senhor denunciou a corrupção de agentes.
MA – Várias formas, vários fatores. Tinha muito rebolo, de jogar por cima da muralha, justamente porque a pessoa tinha uma aproximação. Não tinha uma área de segurança. Não foi feito uma lei de área de segurança. A pessoa ficava grávida… Quando estive aqui, em 2016, uma senhora tentou entrar em uma unidade, grávida, com 160 celulares. Ou seja, a barriga todinha era de celular… E a parte que demanda de responsabilidade dos agentes está sendo investigada. Mas isso é pequeno. Lógico que uma maçã podre ali me traz um prejuízo danado. Mas a gente está investigando e pode ter certeza que vamos cortar na carne, tranquilamente. Para mim, o pior bandido que tem é aquele que coloca todo o resto em risco. O próprio bandido travestido de agente. E esse é o pensamento dos agentes também. Quando tem uma pessoa dessas no nosso meio, qualquer um de nós pode ser vítima dele. E esse é o pensamento geral dos agentes com quem tenho conversado. E pode ter certeza que os agentes aqui estão dando o máximo nessa virada do sistema penitenciário.
OP – Alguma nova transferência está prevista?
MA – Não. Está tranquilo. Mas, se preciso for, a gente transfere também. Não tem problema, não. Se tiver demanda, aparecer demanda, a gente transfere.
OP – Alguma arma foi encontrada nessas unidades?
MA – Não, não foi. Até pensei que seria. Mas não foi.
OP – Com relação à retirada das tomadas das celas, como será feita a iluminação, ventilação?
MA – Todas estão com iluminação externa durante o dia. Mas a gente vai colocar iluminação blindada na parede. E muitas pessoas reclamam: ‘ah, deixaram os presos no escuro’. E não é isso. Energia é diferente de iluminação. E a questão de ventilador, uma ou outra unidade tem ventilador porque acontecia aqui de quando o preso serrava a grade da janela no fundo da cela e fugia, eles (funcionários) iam lá e tapavam o buraco. E não era esse o problema. Era melhorar a vigilância. Ter uma vigilância aproximada. E por isso a gente está reabrindo esses buracos para ter a ventilação cruzada. A gente não pode só retirar o ventilador e deixar o preso num forno. Então, a gente está movimentando. Já é calor naturalmente. A gente já passa um calor danado. Então, eu tenho que ter pelo menos a ventilação, porque quente vai ser. A gente está revendo isso e está vendo a sistemática de uma ventilação forçada. Mas eletricidade na sala não vai ter. Terá iluminação indireta, protegida por uma placa de policarbonato para eles não terem acesso à eletricidade. Vamos melhorar essa questão.
OP – E os televisores, retornarão?
MA – Não. Se eu tivesse um canal controlado, talvez. Mas a gente vai voltar a ter a rádio. Ela vai ter, mas ela vai ser altamente educativa. Estamos dobrando a quantidade de presos na sala de aula. Redistribui alguns recursos para melhorar a capacitação dos internos. Vamos ter uma faixa de quatro mil internos capacitados. Acho que só duas folhas para essa entrevista não vai caber (risos). Então, a gente mexendo aqui, resolveu que em algumas unidades dá pra reformar, que é melhor do que construir. Sai mais barato. Então, quatro mil presos capacitados. Estou dando uma profissão para eles. E um interno, para eu manter hoje, dentro do sistema, é de R$ 2 mil a R$ 2.500 mil por mês. E para dar uma profissão para ele é menos de R$ 1.000, uma única vez. Não é gasto, é investimento. E você vai ter o retorno enquanto ele estiver dentro do sistema. Eu consigo utilizá-lo. Imagina, ninguém quer morar perto de uma unidade prisional. Mas imagina uma escola perto da unidade. Se todas essas escolas tivessem as cadeiras reformadas pelos presos? As macas de hospitais sendo reformadas, uniformes de escola fabricados dentro das nossas unidades prisionais? Roupas de cama de hospitais? Férias escolares. O prefeito diz: ‘poxa, essa escola tá ruim. O que é que eu faço? Vou falar com os meninos do sistema penitenciário e a agendar aqui’. Ele compra o material e eu vou com a força tarefa de presos e resolvo a situação em um mês. Quer dizer, é um equipamento que é mal utilizado porque não se direciona para isso, não se canaliza para isso. Praças! São tão infinitas as possibilidades que você pode fazer e usar para o bem as unidades. Mas, para isso, eu preciso ter um investimento inicial. Eu tenho investimento e ele deve me dar o retorno para isso. Quebro o preconceito e começo a mostrar para o ser humano que tem jeito para a vida dele. Agora, depende dele. E o mais interessante disso tudo é você ver que, daqui a cinco, seis anos, essa pessoa não vai reincidir mais. Se eu não consigo curar o vício dele aqui dentro do sistema penitenciário, pelo menos, ele vai sustentar o seu vício.
OP – Qual balanço o senhor faz desse primeiro mês de gestão?
MA – Muito enfrentamento e trabalho. Não cheguei aonde eu queria e nem começamos ainda. Muito trabalho, muito enfrentamento e reagindo. Mas cada ação dentro do sistema terá uma reação do Estado. Pode ter certeza disso. E mais pesada.
OP – Com relação às transferências, por que elas não se estenderam aos membros do PCC?
MA – Por falta de motivo. Eu tenho cinco agências de inteligência trabalhando, o Ministério Público. E não foi constatado nenhum ataque da parte dele. O que me justificaria fazer isso? A ação que tive contra eles, primeiro, foi a separação de liderança, que eu ia fazer mesmo. Eu não deixo líder dentro de unidade prisional. Segundo, pelo motim. Inclusive, foram quase 200 presos autuados. Então, a resposta que eu tinha a dar para ele, eu dei. Se eu tivesse que pesar mais a mão, eu ia pesar. Então, eu trabalho bem tranquilo nessa parte de justiça. Agora, se eu precisasse transferi-los também, não teria problema nenhum. Agora, se precisar. Não vejo essa necessidade. Está controlado, sem ação nenhuma. Está suspensa a visita deles também. O pessoal fica: ‘ah, pra fazer acordo’. Eu não faço acordo! Eu não iria sair lá da cada do chapéu, depois de 32 anos de profissão, para fazer acordo com bandido, não! Eu não faço isso. Muito pelo contrário. Se me der motivo, eu vou endurecer com eles. Mas não se justifica. Teve uma ala na CPPL IV que ficou sem visita porque foi a única que me deu problema. Agora, se precisar, eu paro o sistema todo, sem problemas. Depende da necessidade.
OP – Quando o senhor adotou essas medidas, cogitou não ter apoio do Governo Federal?
MA – Eu sou bem tranquilo. Se precisar de apoio, chamo até os escoteiros para me ajudar. A Segurança é dever do Estado e o Estado brasileiro tem esse dever, principalmente pelo que a gente enfrenta hoje. E é reponsabilidade de todos. Está na nossa Constituição. Todo mundo tem que contribuir. A população começou a colaborar e diminuiu os ataques. A polícia foi lá e antecipou vários outros. Eu trabalho pela população, pelo governo, pelo povo, para mim, para a minha família e o futuro dos meus filhos. Se eu não fizer agora, quem vai fazer amanhã? É responsabilidade de todos. Agora, lógico que a gente precisa de uma estrutura, que as pessoas que a gente está trazendo, principalmente para o sistema penitenciário, são especialistas. Tem gente que esteve comigo em 2016, que esteve comigo em Natal (RN).
OP – Então o senhor tinha a certeza de que, se precisasse, contaria?
MA – Sim. Assim como daqui a algum tempo, se precisar de novo, eu peço. A Força de intervenção passou comigo quase um ano em Natal. E isso a gente tinha seis pessoas da Força para mim. Mas isso faz uma diferença muito grande na questão de conhecimento. As pessoas costumam dizer que não existe ninguém insubstituível, mas faz uma falta danada. Têm pessoas que realmente fazem falta, te ajudam bastante, e vamos adiante. Você vê que a gente está em modo acelerado, com turbo ligado. Fizemos muita coisa? Fizemos. Mas temos muito trabalho pela frente.
OP – Essa reação nas ruas, no Rio Grande do Norte, foi mais duradoura que aqui?
MA – Natal eu não peguei reação. São situações diferentes. Eu assumi depois que o sistema estava controlado. Depois de controlado, eles tentaram alguma coisa e a gente reprimiu de imediato, as forças de segurança e nós dentro do sistema. Se tentar contra o Estado, a gente endurece. São duas situações: uma foi quando eles estavam rebelados e a gente foi lá para retomar. A outra foi depois de controlado o sistema. Eu assumi e depois de alguns meses eles começaram atacar. Queimaram dois ônibus e uma viatura do Corpo de Bombeiros em Mossoró. Eu abduzi os presos de Mossoró que estavam provocando a situação e trouxe para Alcaçuz. É simples. Quem der problema no Interior, vem para a Capital.
OP – O senhor esperava uma reação tão duradoura aqui?
MA – Não dá para ter uma ideia. Quem manda é o cliente. Vai ter uma resposta. Então, vamos ver. O que a gente tem que admitir é que realmente houve ataque e a sociedade há muito tempo está em guerra com a bandidagem. Não são as Forças de Segurança, é a sociedade. Em todo País, a sociedade está sendo massacrada. Você vê mortes e mortes. As pessoas matam única e exclusivamente por apertar o gatilho. E a sociedade está reagindo contra isso. Uma coisa que é vantajosa aqui é a resposta das Forças de Segurança. Teve duzentos e poucos ataques, não sei se estou desatualizado, e quatrocentas e poucas prisões. E tudo rápido. Se anteciparam em várias outras, policiais trabalhando de folga, voltando das férias. As Forças de Segurança estão de parabéns. População denunciando, que é o principal. Detalhe, é extremamente seguro denunciar. E é do que a gente precisa. Informação para ir buscar. Isso foi decisivo.
OP – Aprova o pacote do Moro no que toca o sistema penitenciário?
MA – Aprovo. Não existe uma legislação específica, por exemplo, eu estou com as lideranças separadas na cela, ambiente próprio para ele, ambiente de segurança máxima. Mas ele está respondendo legalmente só pelo crime que ele cometeu. Ele não vai responder por fazer parte de facção. Então, tem que ser endurecido mesmo. Tem que acabar com esse negócio de passar a mão na cabeça. A sociedade é quem pena. E têm pessoas que não querem sair do crime. É a vida deles. Então, que eles permaneçam no crime, mas permaneçam controlados pela sociedade. Não é justo passar nas casas e ver que parece presídio. Mais seguro que nas cadeias públicas: sistema de alarme, cerca, guarda aramado. Inversão total de valores. Então, o caminho é esse. Tem que endurecer e tem que ter apoio do Governo Federal. E espero que eles venham a me mandar mais 100 agentes para passar mais 90 dias comigo aí, dar uma força para resolver isso aí.
OP – O senhor já pediu mais 100 agentes? São quantos hoje?
MA – Já pedi. Hoje são 70 agentes. Eu pedi 80, vieram 70. E agora eu pedi mais 100. Estou precisando.
OP – Todos treinados pelo senhor? Já houve retorno do pedido?
MA – Todos treinados por mim. Especialistas no que fazem. Eles fazem a diferença. E estou esperando. O que acontece é que, no sistema penitenciário, o teu trabalho não aparece muito. Quando aparece, é porque está dando problema. Se não tem notícia do sistema penitenciário, é porque está tudo bem. Mas o trabalho é muito intenso. É matando uns dez leões por dia. E eu preciso desse pessoal para implantar os procedimentos, treinar os agentes e visualizar, até ficar consolidado.
OP – Alguma outra forma de estancar a finança das facões no sistema?
MA – Tirar celular, tirar televisão, que é meio de comunicação e meio de renda para eles também. Controlar os visitantes para evitar prostituição e abusos. Acabar com os mercados que tinham dentro das unidades prisionais. Mercado de droga, mercado de tudo.
OP – O senhor recebeu alguma ameaça concreta por conta desse trabalho feito aqui?
MA – (Risos) Assim, estou ameaçado, né! Mas também não estou preocupado com isso, não. Do jeito que vem, vai também.
OP – Mas elas chegaram de qual forma? Salves, redes sociais?
MA – É, salve… Das mais diversas formas. Isso aí não me preocupa muito, não. Tem que entrar na fila. Antes de eu vir para cá, tinham 30 mil querendo me matar. Mais 30 mil, são 60 mil. Não faz diferença, não. Não ando contando ameaças. Ando precavido. A gente vai vencer.
Nordeste Notícia
fonte: O Povo/Mauri Melo