Para funcionar em feriado o acordo deve estar previsto em convenção coletiva
 Para funcionar em feriado o acordo deve estar previsto em convenção coletiva Crédito: FERNANDA BARROS

O ministro do Trabalho, Luiz Marinho, publicou uma portaria no Diário Oficial da União revogando várias atividades do comércio em geral que tinham permissão permanente para o trabalho aos feriados.

Entre eles supermercados, farmácias, atacados, distribuidores de produtos alimentícios e feiras livres. Essa portaria havia sido editada em novembro de 2021, na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro, que facilitava o trabalho nessas datas.

Com a nova regra em atividade, os trabalhos nos feriados de algumas categorias do comércio e comércio em geral somente será permitido se houver previsão em convenção coletiva da categoria e observada a lei municipal.

Veja segmentos afetados pela portaria

•varejistas de peixe;
•varejistas de carnes frescas e caça;
•varejistas de frutas e verduras;
•varejistas de aves e ovos;
•varejistas de produtos farmacêuticos (farmácias, inclusive manipulação de receituário);
•comércio de artigos regionais nas estâncias hidrominerais;
•comércio em portos, aeroportos, estradas, estações rodoviárias e ferroviárias;
•comércio em hotéis;
•comércio em geral;
•atacadistas e distribuidores de produtos industrializados;
•revendedores de tratores, caminhões, automóveis e veículos similares; e
•comércio varejista em geral.

De acordo com Rafael Sales, presidente da Comissão de Direito do Trabalho da Ordem dos Advogados do Brasil – Secção Ceará (OAB/CE), que é preciso lembrar que a portaria que foi revogada, ela foi criada em 2021.

E qual foi a novidade que ela criou na época? Sales informa que ela permitiu que as empresas tratassem diretamente com os seus empregados sobre a possibilidade do trabalho aos feriados.

“Então a empresa chegava para o empregado, olha, a gente está querendo funcionar no feriado e aí eu gostaria que você assinasse, você concorda? Em termos práticos, acabava muitas vezes sendo uma imposição. Então ficava mais de acordo com a vontade do empregador”, diz o advogado.

Negociações coletivas

Com a revogação dessa portaria ele diz que passa a ser exatamente como era antes de 2021. As empresas, ao invés de procurar o seu próprio empregado de forma individual, ela tem que negociar com o sindicato que representa aquele trabalhador.

“Assim, a empresa precisa chegar até o sindicato e dizer, olha sindicato, eu quero funcionar nesse feriado. Teria como a gente fazer aqui uma negociação para ver os melhores termos entre a empresa e o trabalhador”, observa.

Os termos que o presidente da Comissão de Direito do Trabalho OAB Ceará cita como exemplo são a possibilidade de conceder uma folga para esse trabalhador no outro dia e de efetuar o pagamento em dobro desse dia do feriado.

“Isso traz mais segurança para a classe trabalhadora, porque ao invés de você negociar diretamente com o seu patrão, você vai ter um sindicato lhe representando na mesa de negociação, evitando assim desgaste do trabalhador com o patrão”, ressalta.

E faz uma suposição ao imaginar o trabalhador que chega e diz, “olha, não, eu não quero trabalhar no feriado. Como é que o patrão vai enxergar isso? Outra situação é o sindicato comunicando isso pelos trabalhadores”.

Para Sales, do ponto de vista do direito do trabalho, ele considero que a revogação da norma anterior é um grande avanço, porque devolve aos sindicados o protagonismo da negociação coletiva de um ponto que é muito importante para os trabalhadores, que é o descanso no feriado”, conclui.

O que avaliam os trabalhadores

Francimar Silva, presidente da Federação dos Trabalhadores, Empregados e Empregadas no Comércio e Serviços do Estado do Ceará (Fetrace),  diz que a revogação dessa portaria é fundamental e é uma vitória para os trabalhadores do comércio e serviço do Brasil.

“Ela vai fortalecer as convenções coletivas, fortalecer os acordos coletivos, que são instrumentos mais adequados para garantir os direitos dos trabalhadores. Então, essa portaria tem sofrido uma alteração desde o governo Michel Temer, um desmonte que vem de lá para cá, dos direitos dos trabalhadores”, aponta.

Segundo ele, os domingos e os feriados estavam sendo, de uma certa forma, os trabalhadores estavam sendo explorados com essa portaria que foi lançada em 8 de novembro de 2021.

“Agora, em janeiro, nós começamos as nossas negociações, começam os nossos acordos e convenções coletivas, que geralmente a nossa maior data-base é janeiro, isso foi uma vitória dos trabalhadores, para que nós possamos garantir o direito dos trabalhadores ao trabalhar os domingos e feriados”, defende.

O que pensa o setor de supermercados

Procurado pelo O POVO, a Associação Cearense de Supermercados (Acesu) se manifestou por meio de nota que diz que a entidade “entende que a revogação dos dispositivos da Portaria 671/2021, que conferiam autorização permanente para o funcionamento do comércio varejista de alimentos em feriados, reacenderá a discussão sobre a necessidade de negociação coletiva para a abertura em tais datas, situação essa que, sem dúvida, resultará em profunda insegurança jurídica para as empresas do setor, principalmente àquelas situadas em cidades que não possuem sindicatos representativos das categorias laboral e/ou patronal e que, portanto, a prévia negociação coletiva sequer se revela possível. Além disso, é inequívoco o impacto para a população, que será diretamente afetada pela restrição imposta ao funcionamento de um setor de indubitável essencialidade”.

O que segue a posição da Associação Brasileira de Supermercados (ABRAS) que acredita que “a medida significa um retrocesso à atividade econômica essencial de abastecimento exercida pelos supermercados. Com a revogação, os supermercados e hipermercados terão dificuldades para abertura das lojas em domingos e feriados, sem prévia autorização de convenção coletiva e aprovação de legislação municipal, oque representará elevação significativa nos custos de mão de obra, além de reduzir a oferta de empregos, face à inevitável redução da atividade econômica”.

A Abras ainda continua na nota dizendo sobre o impacto do setor e que com a abertura do comércio aos domingos e feriados favorece não somente o consumo e a geração de empregos, mas também e, principalmente, o atendimento dos 28 milhões de consumidores que diariamente frequentam os supermercados, através de 94.706 mil lojas em todo o Brasil.

Comércio em hotéis

O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Ceará (ABIH-CE), Regis Medeiros, diz que teria que se aprofundar um pouco mais na portaria, mas disse que “ está se mexendo no que está quieto e no que o mercado se autorregula”.

Para ele o feriado pode ser bom dia de vendas até é um bom dia de ganho para os trabalhadores porque ele ganha comissão. E que na hotelaria não se fecha nunca.

“O hotel não fecha nos 365 dias do ano. Qualquer coisa que vier para complicar isso ou aumentar custos dessa manutenção aberta ou desse tipo de coisa é sempre um fato negativo para autorregulação e geração de emprego e geração de renda”, observa.

Para Regis quanto mais leis, quanto mais burocracia só atrapalha a geração de emprego e renda. “Temos que tentar ser o mais simples possível. Hoje já é pago em dobro um feriado para o funcionário que trabalha e é reposta aquela folga. Na hotelaria já funciona assim atualmente e funciona muito bem. E acredito que na nossa convecção de hotelaria isso já está posto”, declara Medeiros.

Impacto em Fortaleza

Assis Cavalcante, presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) Fortaleza, diz que para o comércio em Fortaleza nada mudou. Isso porque na convenção coletiva 2023-2024 já há um acordo para abertura de lojas em todos os feriados, menos no Carnaval e no dia 1º de maio (dia do trabalhador).

Nestes dois casos, ainda que haja a oferta de pagamento dobrado ou compensação ao trabalhador é vedado o funcionamento das lojas. Esta é uma situação que ele pretende mudar na próxima negociação.

“Agora o que nós queremos é o contrário. Queremos abrir o comércio independente de convenção coletiva. Pretendemos abrir e pagar o empregado e dar folga no feriado do mesmo jeito que já damos no domingo. Porque um dia com uma loja fechada representa 5% a menos no faturamento”, explica.

Segundo Cavalcante, abrir no feriado obedecendo a convenção coletiva é muito caro. E o que mais estão querendo no momento é abrir as lojas do shoppings no carnaval. “O Ceará e Fortaleza estão nos primeiros destinos turísticos do Brasil, segundo do Norte Nordeste, e Fortaleza é única cidade que fecha no Carnaval, sendo uma cidade turística”, analisa.

Ele observa que todo o esforço dos governos municipal e estadual são “jogados fora. Isso é um prejuízo enorme. O mundo todo funciona nos feriados é só respeitar a legislação da CLT. Hoje nosso maior pleito é trabalhar no Carnaval. No feriado do Carnaval”, enfatiza.

 

 

O Povo

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