Em uma corrida contra o tempo para votar a PEC da Transição antes do projeto de Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2023, a equipe de transição do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ainda enfrenta obstáculos para tentar emplacar a proposta no Congresso Nacional.
No Senado Federal, as negociações ainda estão em andamento para viabilizar uma proposta alternativa à que foi apresentada na Casa, tendo em vista a falta de consenso sobre o texto. A PEC da Transição deve ser votada primeiro no Senado para depois ser apreciada na Câmara dos Deputados.
A falta de unanimidade sobre a proposta também tem refletido na bancada cearense, que diverge sobre o texto apresentado pelo grupo do petista.
Até parlamentares aliados do presidente eleito reconhecem a necessidade de abrir diálogos diante dos impasses envolvendo a matéria. Muitos dos parlamentares do Ceará, inclusive, se manifestaram a favor da quebra do teto de gastos, mas com ressalvas.
No Senado, há um compromisso do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD), de votar a proposta o mais breve possível. Enquanto isso, a equipe de transição de Lula negocia ajustes no texto apresentado para enviar uma versão final da PEC aos senadores.
Depois de ser votada no Senado, a matéria deve ir para apreciação da Câmara. Para passar rapidamente, é necessário que os deputados federais aprovem o texto sem modificações. Caso contrário, a matéria pode voltar para apreciação dos senadores.
A PEC da Transição propõe a acomodação do Auxílio Brasil (ou Bolsa Família, como deve voltar a ser denominado) no Orçamento do próximo ano por meio da suspensão do teto de gastos sobre o programa.
A ideia é manter o pagamento no valor de R$ 600 com um adicional de R$ 150 para famílias com crianças de até seis anos de idade. Com isso, a política pode custar até R$ 175 bilhões aos cofres público em 2023. Ao todo, o atual texto da PEC da Transição extrapola o teto orçamentário em R$ 198 bilhões.
BANCADA ESTUDA A PEC
Os pontos que mais têm causado impasses na bancada cearense são o equilíbrio fiscal e o tamanho do furo no teto de gastos. O deputado federal Capitão Wagner (União) cobra cautela do novo governo para que o valor extrateto não seja maior do que o necessário.
“O equilíbrio deve existir. A gente acredita que essa PEC vai ser discutida no Congresso, tanto no Senado como na Câmara, para que a gente encontre um denominador que garanta o Auxílio Brasil, o Bolsa Família, no valor de R$ 600 e, ao mesmo tempo, não fure o teto de gastos com um valor além do necessário – que é o que está sendo apresentado”, projeta.
Já o deputado Danilo Forte (União) aponta que as medidas defendidas por Lula durante a campanha precisam de espaço no Orçamento, o que demanda uma discussão mais ampla sobre os limites de gastos do novo governo.
“Tem que resolver a questão (do piso) dos enfermeiros, tem programa de governo que ele (Lula) quer retomar como o Casa Popular (Minha Casa, Minha Vida), Farmácia Popular. Então, para cada programa vai ter uma discussão sobre o teto? É melhor a gente fazer uma discussão que abarque logo tudo isso. O Brasil precisa resolver seus problemas estruturantes”, afirma.
Outros deputados informaram que aguardam o início da tramitação para tomar uma posição, como é o caso de Denis Bezerra (PSB), Heitor Freire (União), Domingos Neto (PSD) e Genecias Noronha (PL).
Entre os parlamentares da bancada cearense no Senado, dois disseram ser contrários ao texto do jeito que está.
“Estou estudando com muito cuidado o texto dessa PEC, porque a responsabilidade fiscal é uma grande conquista do País. Mas, do jeito que chegou, parece uma ‘PEC do Fim do Teto de Gastos’. Precisamos resolver o aumento do valor do Auxílio Brasil, porém sem incremento da inflação por conta da má gestão e imprevisibilidade da economia. Um governo perdulário poderia corroer o valor concedido aos mais pobres. Como veio a redação, com possibilidades ilimitadas, votarei contra”, afirma o senador Eduardo Girão (Podemos).
Em entrevista ao UOL, o senador Tasso Jereissati (PSDB) reconheceu a necessidade de quebrar o teto de gastos para que o novo governo continue pagando os R$ 600 do Auxílio Brasil, que deve voltar a se chamar Bolsa Família, mas cobrou ponderação.
O tucano, inclusive, ressaltou que votará contra o texto, caso não haja moderações.
ALTERNATIVAS
Para tentar atender aos anseios do novo Governo de forma mais moderada, Tasso apresentou uma PEC que aumenta o gasto federal em R$ 80 bilhões fora do teto para 2023 – menos da metade do indicado pela equipe de transição de Lula.
Para Tasso, o montante também permitiria a alocação de recursos em despesas discricionárias, como o aumento real no salário mínimo, outro compromisso assumido por Lula durante a campanha.
Por meio de assessoria, o deputado Dr. Jaziel (PL) informou que está aguardando definições sobre textos alternativos, como o do senador Alessandro Vieira (PSDB-SE), que limita em R$ 70 bilhões a despesa extrateto.
BANCADA DO PT TENTA DIÁLOGO
A indefinição sobre qual proposta deve ser discutida adiou, inclusive, uma reunião da FE Brasil (Federação do PT, PCdoB e PV) sobre o tema. Segundo o deputado José Airton (PT), os parlamentares discutiriam o assunto na última terça (22), mas resolveram atrasar o diálogo porque ainda aguardam acordo no Senado para que o texto seja aprovado e siga para a análise da Câmara.
Na Câmara, todos os petistas cearenses vão votar a favor da matéria e tentam viabilizar mais votos favoráveis.
“A PEC do Bolsa Família e do Salário Mínimo, que é como eu chamo a PEC da Transição, é uma necessidade para o País prorrogar o Auxílio Brasil (de R$ 600). (…) A PEC da Estabilidade Política precisa ser aprovada emergencialmente, não tem que ter esse frisson do mercado. Todo mundo sabe que o Lula foi eleito com um programa e sempre foi dito que ele daria direito as pessoas comerem três vezes por dia. Quem está fuxicando contra isso é porque não tem responsabilidade social com o País”, declarou José Guimarães.
“É fato, claro, que vou votar favorável. Mas eu acho que alguns ajustes precisam ser feitos e vai depender de como a negociação lá (em Brasília) avançou em relação aos demais partidos, inclusive em relação ao centrão”, destacou Luizianne Lins.
ADESÃO NA CÂMARA
Enquanto no Senado Girão e Tasso se afirmam desfavoráveis à PEC, na Câmara o texto parece ter mais adesão da bancada cearense.
Além dos petistas, pelo menos cinco deputados disseram ao Diário do Nordeste que votam pelo “sim” em relação à iniciativa de Lula.
Presidente do PDT no Ceará, André Figueiredo disse que a bancada do partido votará favorável à matéria. Dentre os pedetistas cearenses, somente Eduardo Bismarck confirmou o voto: “Irei votar a favor”.
Além deles, AJ Albuquerque (PP), Moses Rodrigues (União) e Júnior Mano (PL) também informaram que são favoráveis à medida. Este último ressaltou que a posição só vale “se for para manutenção de 600+150” do Auxílio.
Já Célio Studart (PSD) deixou clara sua posição de que apoiará a proposta caso não haja outra alternativa para alocação dos recursos. “É inegável a urgência da destinação de recursos para o principal programa social do governo federal”, justifica.
Não responderam aos questionamentos do Diário do Nordeste até o fechamento desta reportagem Idilvan Alencar (PDT), Leônidas Cristino (PDT), Mauro Filho (PDT), Pedro Bezerra (PDT), Robério Monteiro (PDT) e Vaidon Oliveira (União). O senador Júlio Ventura, suplente em exercício na vaga de Cid Gomes (PDT), também não se pronunciou.
Diário do Nordeste