Com olhar minucioso para cada detalhe, a artesã e costureira Dalvani Oliveira Sousa, 69, cria um biquíni, um vestido e uma saia de bailarina, que cabem na palma de sua mão. É na máquina que passa o dia inteiro, sentada, costurando roupas para bonecas e restaurando estes brinquedos no “hospital das bonecas”, que montou em Barbalha, no Cariri cearense.
Quem chega ao local com bonecas quebradas ou velhas, já tem a garantia que sairá com o brinquedo recuperado, seja vestindo novas roupas, seja colocando algum membro do corpo que está em falta, como braço e perna.
Inclusive, a costureira começou a juntar pé, braço, cabeça e outros membros de bonecas, que encontrava no lixo ou que eram doados pela vizinhança, para montar o seu “banco de órgãos”, como ela mesma chama. O valor da restauração depende do tamanho, mas varia entre R$ 25 e R$ 45. O trabalho dura um dia inteiro, já que ela faz toda limpeza e cria uma nova roupa, além de procurar, com cuidado, a parte do corpo idêntica à que está faltando.
Agora, a costureira tem uma infinidade de bonecas no seu apertado ateliê. A variedade é extensa. Além disso, enumera clientes em São Paulo, Rio de Janeiro, Maranhão e Pernambuco.
Adolescência
A costura chegou na vida de Dalvani na adolescência, quando fazia reparos de farda escolar para as crianças de Crato, sua cidade natal. Com o talento, começou a desenvolver também peças ainda menores para vestir as bonecas de filhas de empresários e políticos da região. É neste ramo que se mantém até hoje.
A mudança para Barbalha aconteceu após se casar com o João Antônio de Sousa, hoje aposentado, com quem teve três filhos. Por coincidência, seu marido foi trabalhar numa fábrica de redes e, por isso, trazia diariamente retalhos de tecido para Dalvani criar bonecos de pano para suas meninas. “Nossos brinquedos era ela que fazia”, reforça a empresária Joseane Oliveira, filha da costureira.
Depressão
Foi com o trabalho realizado no “hospital de bonecas” que a costureira venceu a depressão quando ficou imobilizada em uma cama. “Eu me reanimei. Me sinto melhorar das dores. A depressão acabou. Ainda trabalharei por tempo indeterminado. Não paro mais”, finaliza.
Sua vida mudou há 10 anos, quando começou a sofrer com artrose. “Fiquei paralisada do corpo”, lembra. Foram mais de seis meses deitada numa cama, sem forças para andar. Acostumada a costurar a vida inteira, isso logo afetou sua saúde mental. “Fiquei depressiva. Era constrangedor não fazer nada”, admite. Com três filhos morando em outra cidade e seu marido trabalhando o dia inteiro, Dalvani ficou sozinha em casa.
Ao perceber a mãe abatida, os filhos resolveram transformar um antigo imóvel que estava para alugar, no bairro Alto do Rosário, no seu ateliê, onde permanece. Rapidamente, o humor mudou. “Aqui é uma terapia. Se não fosse isso, ela estaria numa cadeira de rodas”, acredita o marido João. “O trabalho dela é inspirador. A gente sente a satisfação de trabalhar”, completa Joseane.
Lá, Dalvani passa oito horas por dia. A pausa é só para almoçar. A companhia do marido, dos vizinhos e, principalmente, das crianças, retomou o sorriso dela. Como “médica”, consertando os brinquedos, e “estilista”, criando seus próprios modelos de roupas, trata as bonecas como suas “filhas”. Curiosamente, este não foi um objeto presente em sua infância. “Eu só tive uma boneca de louça. Como era muito preciosa, não podia brincar para não quebrar”, confessa.