A mesma idade, 25 anos, o mesmo “quintal”, a Baía de Guanabara, e o DNA da vela. Martine Grael e Kahena Kuzne, campeãs olímpicas da classe 49er FX na Rio 2016, têm muito em comum. O amor pelo esporte que herdaram da família, personalidade forte, competitividade. Talvez isso explique o sucesso delas na Olimpíada. Mas foi quando aceitaram e respeitaram as diferenças que elas encontraram a rajada de vento perfeita para o sopro até o ouro.

– É um filme que está passando, mas será que é verdade? Estou emocionada. Elas combinam muito, um casamento perfeito. A Tine (Martine) sempre foi a capitã, e a Kahena no começo não lidou bem com isso, elas tiveram que fazer esse ajuste. Mas é um casamento perfeito. Elas são guerreiras, vão à luta. Não têm medo de nada, nem de vento, nem de tempestade – contou Audrey Kunze, mãe de Kahena.

Quando Audrey fala em “capitã”, quer dizer que Martine é a proeira, quem dita as manobras, e a filha, a timoneira, responsável por, dentre outras funções, trocar as velas. A parceria que deu a medalha de ouro ao Brasil nesta quinta-feira começou na década passada, quando as adolescentes eram concorrentes ferrenhas na classe 420 e resolveram se unir. De cara foram campeãs do Mundial júnior em 2009, disputado em Búzios, na Região dos Lagos.

– Fui o treinador delas quando ganharam o Mundial. Não tinha dúvidas de que chegariam nesse momento. Sabia que seriam boas velejadoras. De lá para cá, a Martine fez um ciclo olímpico com a Isabel Swan na classe 470, mas não conseguiram a vaga. Enquanto isso, a Kahena ainda estava decidindo se seria profissional – disse Fernando Sesto, primeiro técnico da dupla dourada.

Mas a dupla se desfez e foi estudar engenharia ambiental. A vela passou a ser apenas um lazer de fim de semana. Na tentativa com Swan, Martine retomou o sonho olímpico. Não se classificou para Londres 2012, mas acabou sendo convidada pelo Comitê Olímpico do Brasil para ir à Inglaterra e fez parte de um grupo de jovens atletas. Era um plano de convivência, feito para eles sentirem o clima olímpico. Separada de Isabel, não sabia muito o que fazer. Até que uma nova classe feminina foi criada para a Olimpíada. A 49er FX casava com as pretensões de Martine. Era a vez de fazer o convite. E era para amiga Kahena.

– Foram muito momentos de aprendizado, de altos e baixos. Admiro muito a Martine, ela é incrível. O mais importante é estarmos bem. Ao fim de cada regata, fazemos questão de nos abraçar. Isso é o que vale – disse Kahena.

Kahena decidiu mergulhar de cabeça. A vela, que por um tempo havia ficado recolhida, voltou a ser içada.

– O que faz a diferença é que temos muita amizade. Tivemos uma mudança importante no nosso relacionamento. A palavra é profissionalização. Somos amigas do peito, mas precisávamos ser amigas e parceiras. Foi uma parceria muito bonita. Ela é uma ótima parceira. Não poderia ter tido esse resultado com mais ninguém. Foi ótimo.

Reparou que Martine disse que “foi uma parceria bonita”? Pois é. Terminada a festa no pódio e a enxurrada de abraços, a dupla não conseguiu responder se seguirá formada.

– Não sei. Daqui a seis meses me pergunta que eu te respondo (risos). Não faço ideia – comentou Martine.

Kahena seguiu uma linha parecida. Sem pressa para pensar no amanhã.

– A competição acabou agora, a ficha não caiu. Preciso respirar um pouco e admirar essa medalha.

Quatro anos depois do início do projeto olímpico, o auge. E os bons resultados marcaram o período. Em 2014, conquistaram o primeiro título mundial da vela feminina do Brasil e foram eleitas a melhores velejadoras do ano pela World Sailing. Venceram os dois eventos-testes no Rio e em 2015 alternaram vitórias e segundos lugares nas competições. Mas viram as adversárias crescerem. Perderam o bicampeonato mundial na última regata e este ano ficaram em sexto lugar no mundial de Clearwater, nos Estados Unidos. Como melhor resultado de 2016 até agora, haviam levado a prata na etapa da Copa do Mundo de Hyeres, na França, e chegaram aos Jogos como líderes do ranking mundial.

Ainda não dá para dizer o que vem pela frente. É como o vento, que a qualquer momento pode mudar de direção.

Fonte: Globoesporte.com

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