A ação judicial “assinada” por Bethoven, cão que foi agredido com um tiro no olho, foi aceita pelo juiz Guido de Freitas Bezerra, da 2ª Vara da Comarca de Granja, no interior do Ceará. Na decisão, o magistrado estabelece distância mínima de 200 metros entre agressor e vítima, com multa que pode chegar a R$ 50 mil. A resolução é inédita no Brasil. O juiz solicita ainda que a autoria da ação seja transferida para o tutor de Bethoven.
O requerimento da defesa de Bethoven, com tutoria do agricultor João Cordeiro da Silva, e escrito pelo advogado José Moura Neto, foi apresentado à Justiça após o animal ser agredido com um disparo de arma de fogo no último dia 14 de março. O crime aconteceu na zona rural do município de Granja, onde vivem João Cordeiro, Bethoven e o réu.
O pedido da defesa era que o agressor não pudesse se aproximar da vítima a uma distância de 500 metros com multa inicial de R$ 1 mil em caso de descumprimento. Contudo, o juiz estabeleceu um limite de 200 metros e punição financeira inicial de R$ 5 mil.
“Concedo ao autor medida de urgência, para o fim de impedir que o réu mantenha contato com o mesmo. A medida visa não só a proteção física, como também a segurança psíquica do animal, razão pela qual limito essa distância ao mínimo de 200 metros”, decidiu o juiz.
“Fixo multa por descumprimento no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) em caso de simples desobediência sem maiores consequências ao tutelado. Em havendo ato gravoso, lesão física, a multa será majorada para R$ 20.000,00 (vinte mil reais); em caso de morte, a multa será no montante de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais)”, complementa a decisão.
“Essa decisão que culmina multa para o agressor é inédita. Ela jamais foi concedida para proteger um animal. Então é o Judiciário reconhecendo que o animal é um ser que sofre. É inédito, porque um animal nunca teve uma ‘medida protetiva’ com a culminação da multa”, destaca Moura Neto, advogado de Bethoven.
Ele reitera que o termo ‘medida protetiva’ pode ser associado à Lei Maria da Penha, mas a decisão se assimila porque estabelece que o réu permaneça a uma distância definida judicialmente.
“É praticamente unânime entre as pessoas minimamente razoáveis e empáticas a noção de que se deve evitar crueldade animal, tanto quanto possível, por uma questão até de não violação de um dever de virtude contra si mesmo”, escreveu o juiz Guido de Freitas Bezerra.
“Não desconheço que vem ocorrendo uma transformação no entendimento sobre a questão, com a adoção cada vez maior da tese de que os animais são, sim, sujeitos de direitos”, complementa o magistrado.
Alteração no autor da ação
Apesar da decisão judicial após a ação “assinada” com a digital da pata do animal, o juiz reforçou a necessidade da alteração na autoria do processo. “No entanto, no atual estágio de nossa Constituição e do direito infraconstitucional, infelizmente, deixo registrado, os animais ainda não são tratados como sujeitos de direitos”, contrapôs o magistrado de Granja.
Contudo, para Moura Neto, a solicitação judicial não altera o valor histórico da decisão. “O Judiciário realmente se preocupou com o bem-estar do Bethoven. Talvez seja uma decisão paradigmática para libertar os animais da exploração. Realmente foi bacana, especialmente vindo do interior do estado”, comemora o advogado.
“Tanto é que na liminar ele reconhece o animal como autor, mas ele pede para retificar o polo por entender que o animal ainda não pode segurar o polo ativo da ação, teria de ser só o tutor. Mas é muito importante a consideração que ele faz em relação aos animais, a questão do dever de proteção que a gente tem”, complementa Moura Neto.
A decisão judicial indica ainda que o valor da multa deve ser destinado a alguma instituição ou fundo que trabalhe com a garantia do bem-estar animal.
Nordeste Notícia
Fonte: G1