Há alguns anos, o poder público e pesquisadores discutem transformar o Caldeirão da Santa Cruz do Deserto, no Crato, em uma Unidade de Conservação (UC) e, futuramente, em um geossítio que integre o Geopark Araripe. Seu tombamento em nível nacional também já foi pensado. No entanto, o cenário atual não está em consonância com planos previstos para o Caldeirão.
O histórico sítio, alvo de romaria anual ocorrida no mês de setembro, localizado a 33 quilômetros da sede do Município, mostra sinais de abandono. A própria estrada que dá acesso ao local está praticamente intransitável.
A principal dificuldade já começa no trajeto. O volume da vegetação impede que os motoristas enxerguem a estrada. A sinalização, ainda que improvisada, também está camuflada no verde.
Na capela de Santo Inácio de Loyola, o mato cresce e os túmulos vizinhos à edificação se escondem. A própria “Santa Cruz”, que batiza o sítio, pende e corre o risco de cair. Já o poço, que dá o nome de “Caldeirão”, ponto turístico atrativo para os banhistas, expõe a falta de fiscalização: latinhas e garrafas plásticas estão espalhadas no local. O prédio que seria dedicado a um museu está fechado e há poucos moradores nas casas próximas – praticamente isoladas.
“Lá, não está tendo a atenção adequada. As estradas ruins, o mato fechado por conta do inverno. O museu, que se diz museu, não funciona. O sítio precisa ser preservado. Vêm pessoas de vários lugares do Brasil e até de outros países. A gente pede que o poder público tome um posicionamento para dar atenção melhor”, suplica o técnico em agropecuária José Antônio Norberto de Carvalho, morador do Assentamento 10 de Abril, comunidade próxima ao cadeirão.
Turismo
José Antônio faz parte de um grupo do Assentamento que realiza turismo comunitário e recebe visitantes de todo Brasil e também do exterior, como em 2017, quando hospedou 14 viajantes franceses por cinco dias. O roteiro incluía uma visita ao Caldeirão da Santa Cruz, primeiro pedaço de terra ocupado pelos agricultores do Movimento dos Sem-Terra (MST), no início da década de 1990, até serem reassentados. “É um lugar histórico para o Crato e para o Brasil”, reforça José.
O secretário-adjunto de Infraestrutura de Crato, Carlos Andson Paiva, explica que o processo licitatório para recuperar as estradas vicinais do Município já foi realizado. Ainda há o prazo para as empresas concorrentes recorrerem, antes de homologar o resultado e começar o trabalho. “A gente espera as chuvas cessarem para iniciar”. Quanto ao roçado do mato, aguarda resolver algumas questões burocráticas. “Em 10 a 15 dias no máximo, será iniciado”, diz. Além disso, garantiu que enviará uma equipe até o sítio para analisar a situação das edificações por lá erguidas.
Preservação
Em outubro de 2017, foi realizado o seminário “Caldeirão da Santa Cruz do Deserto: uma construção coletiva”, organizado pela Universidade Regional do Cariri (Urca) para debater a transformação do local em uma unidade de conservação e, também, em um geossítio do Geopark Araripe. Inclusive, o secretário de Meio Ambiente do Ceará, Artur Bruno, esteve presente.
O primeiro passo foi dado com a conclusão do georreferenciamento, realizado pela Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Territorial do Crato. Agora, serão feitos os estudos sobre os monumentos erguidos, a história e valor cultural do Caldeirão. “Como já tem acervo, esperamos passar pouco tempo nessa etapa. Acho que em 90 dias concluiremos. A parte mais complicada já foi”, explica o secretário Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Territorial, Brito Júnior.
Todo este material será utilizado para viabilizar a produção de um decreto, que seria votado pela Câmara Municipal e, assim, tornaria a comunidade uma UC de Proteção Integral, na categoria “Monumento Natural”, destinado à preservação de lugares singulares, raros e de grande beleza cênica, permitindo diversas atividades de visitação.
“Como Unidade, possibilita angariar recursos do próprio Fundo de Defesa Ambiental para fazer o melhoramento, como implantação de placas de sinalização e manutenção”, completa Brito.
A partir do georreferenciamento, os técnicos do Geopark Araripe começarão a trabalhar o inventário geológico do Caldeirão, pensando na sua inclusão como território da Organização das Nações Unidas para Educação Ciência e Cultura (Unesco). “Aí podemos fazer o mapa, que é cheio de detalhes. A equipe está pronta”, garante Nivaldo Soares, diretor-executivo da instituição, que é ligada à Urca.
O Crato já conta com um geossítio, o Batateiras, que compreende a área do rio homônimo, cortando o Parque Estadual do Sítio Fundão. Porém, até o fim do ano, deve ganhar outro, no sítio arqueológico de Santa Fé, no distrito de mesmo nome. Com área de 8,3 hectares, o local fica a cerca de 20 quilômetros da sede do município de Crato e está a 800 metros de altitude. O principal atrativo são as inscrições rupestres deixadas pelos antigos habitantes que viveram no Sul do Ceará. O lugar deve ser estruturado para receber visitantes e pesquisadores.