O Ceará está vulnerável a duas doenças que há muito tempo deixaram de ser ameaças cotidianas à saúde: sarampo e poliomielite (paralisia infantil). Se por um lado a vacinação não atingiu a meta de 95% nos últimos anos, por outro ainda falta um item básico: saneamento. No Estado, o serviço tem apenas 46% de cobertura.
Em relação à vacina “polio injetável”, aplicada em menores de um ano, o Estado fechou o último ano em 93%, mas na “polio oral bivalente”, para quem tem um ano, ficou com 87,3%, como registra o Ministério da Saúde.
Já sobre a tríplice viral (que protege contra o sarampo, rubéola e caxumba), a cobertura vacinal ficou em 91,5% na 1ª dose e apenas 81,4% na 2ª dose, quando o esquema é de fato completo.
A Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa), analisando a cobertura vacinal, densidade populacional, impacto do turismo e identificando zonas vulneráveis, dentre outros, classifica os municípios de acordo com o nível de risco para as duas doenças.
As informações foram apresentadas no Simpósio “A Importância da Vacinação em Todas as Idades”, com a participação de profissionais da saúde de várias regiões do Estado.
O evento acontece em alusão à Semana Mundial de Imunização (20 a 27 de abril) como uma campanha para aumentar a cobertura vacinal que, em todo o Brasil, registra quedas desde o começo da pandemia de Covid.
RISCO DO SARAMPO
Carlos Garcia, médico ligado à Célula de Vigilância Epidemiológica da Sesa, explica que o sarampo tem um alta capacidade de transmissão e uma pessoa contaminada em outro país pode transmitir o vírus para várias pessoas já dentro de um avião, como exemplifica.
“Se a gente for pensar no CE como um ponto turístico, com um aeroporto com conexões para muitos lugares, essa doença não está erradicada em muitos países e pode se ter casos importados”, detalha.
Os casos de sarampo foram caindo no Ceará, sendo registrados 16 diagnósticos em 2019 e apenas 1 em 2022. Desde o último ano não é registrado nenhum caso de sarampo. Os países onde há circulação endêmica do poliovírus selvagem são o Paquistão e o Afeganistão.
O sarampo é uma doença infecciosa grave que pode levar à morte com transmissão por meio da tosse ou da fala, por exemplo. Confira os principais sintomas da doença:
- Manchas vermelhas no corpo
- Febre alta, acima de 38,5°
- Tosse seca
- Irritação nos olhos (conjuntivite)
- Nariz escorrendo ou entupido
- Mal-estar intenso
O Ministério da Saúde explica que, em torno de 3 a 5 dias, é comum aparecer manchas vermelhas no rosto e atrás das orelhas que se espalham pelo corpo. A persistência da febre pode indicar gravidade, principalmente em crianças menores de 5 anos de idade.
REINTRODUÇÃO DA POLIOMIELITE
A poliomielite, conhecida como paralisia infantil, é causada por vírus que pode infectar crianças e adultos, por meio do contato direto com fezes ou com secreções eliminadas pela boca das pessoas doentes. Por isso, a doença é ligada à falta de saneamento e habitações precárias.
O último caso da doença no País foi registrado em 1989. No Ceará, o poliovírus selvagem foi isolado pela última vez em 1988 no município de Crateús, na região Norte. O Iêmen e o Azerbaijão estão entre os países com maior circulação deste vírus.
As principais sequelas envolvem dificuldade de falar, atrofia dos músculos e perda de movimentos. Veja os principais sintomas da poliomielite:
- Febre
- Mal-estar
- Dor de cabeça
- Dor de garganta e no corpo
- Vômitos
- Diarreia
- Constipação
- Espasmos
- Rigidez na nuca
“No mundo, a poliomielite não é erradicada, e um dos fatores que determina o risco de reintrodução é a falta de saneamento básico”, analisa Carlos.
ACESSO À ESGOTO NO ESTADO
A Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece) informou à reportagem que opera com os serviços de abastecimento e esgotamento sanitário em 152 municípios. No Estado, o índice de cobertura de esgotamento sanitário alcança 46,06% e o de abastecimento 99,18%.
MENINGITES NO CEARÁ
Além das duas doenças com risco de reintrodução, Carlos Garcia também dá destaque a situação das meningites que voltam a registrar casos semelhantes ao período anterior ao isolamento social por causa da Covid.
“Na pandemia, tomamos medidas que diminuíram o contágio das doenças pela lavagem das mãos e uso das máscaras”, contextualiza.
Em 2019, o Ceará teve 532 casos confirmados de meningite. Número que caiu para 263, em 2020, e 233, em 2021, subindo para 325 no ano seguinte até alcançar 480 casos no ano de 2023. Até o momento, em 2024, 94 registros de meningite foram feitos.
A doença pode ser de dois tipos: virais ou bacterianos. “Nós temos a predominância das meningites virais e é importante pensar que uma parte delas é causada por arbovírus”, completa o especialista.
DIFTERIA, COQUELUCHE E TÉTANO
Algumas doenças como difteria, tétano e coqueluche (DTP) ainda são registradas em baixas proporções no Ceará. Mas, na realidade, o Estado poderia estar livre de todas apenas com a vacinação.
O tétano, por exemplo, causou 11 mortes entre 2020 e 2023. Já a coqueluche teve 61 confirmações entre 2019 e 2023. Um paciente com difteria foi atendido no Estado em 2021.
Para o especialista, muitas vezes as vacinas contra essas doenças são deixadas de lado porque a vacinação massiva foi capaz de diminuir expressivamente a transmissão delas. Contudo, a situação preocupa à medida que menos gente está protegida.
“Muitas dessas doenças não fazem parte do cotidiano das pessoas. Então, quando falamos em difteria, não temos a imagem de uma pessoa sufocando. Quando falamos de coqueluche, não temos a imagem do bebê tossindo até ficar roxo”, conclui sobre a gravidade das doenças.
Diário do Nordeste