Prefeitos e ex-prefeitos do Ceará começaram a responder ao Tribunal de Contas da União (TCU) por possível uso irregular do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), antigo Fundef. Segundo as ações, pelo menos R$ 108 milhões que deveriam ter ido para a educação básica acabaram destinados a escritórios de advocacia.

 

Prefeitos e ex-prefeitos do Ceará começaram a responder ao Tribunal de Contas da União (TCU) por possível uso irregular do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) (Foto: Leopoldo Silva/ Agência Senado)
Foto: Leopoldo Silva/ Agência SenadoPrefeitos e ex-prefeitos do Ceará começaram a responder ao Tribunal de Contas da União (TCU) por possível uso irregular do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb)

De acordo com o site O Povo Ao todo, 21 cearenses – entre prefeitos e ex-prefeitos – são alvo de tomadas de contas na Corte, que concluiu em outubro do ano passado uma mega auditoria sobre o pagamento de honorários advocatícios com recursos do Fundeb. Os processos, que foram abertos no fim de 2020, começaram a receber defesas de ex-prefeitos do Ceará no último mês.

Das escolas para os escritorios(Foto: Das escolas para os escritorios)

Foto: Das escolas para os escritoriosDas escolas para os escritorios

 

O caso teve início ainda em 1999, quando o Ministério Público Federal (MPF) moveu ação apontando erro na base de cálculo da União para repasses do Fundef para estados e municípios. O processo acabou tendo desfecho apenas 16 anos depois, em julho de 2015, quando a União foi condenada a pagar mais de R$ 91 bilhões aos outros entes federados.

Antes mesmo da resolução desse caso, no entanto, diversos municípios brasileiros, principalmente do Norte e do Nordeste, entraram com ações paralelas na Justiça cobrando a correção do repasse. No Ceará, a articulação contou inclusive com coordenação da Associação dos Municípios do Estado do Ceará (Aprece).

Na época, em vez de usarem as próprias procuradorias municipais ou a assessoria jurídica da Aprece, as prefeituras contrataram uma série de escritórios de advocacia, prevendo o pagamento de até 20% do valor recebido nas ações como honorários advocatícios.

Como os processos envolviam cifras volumosas, o cálculo de honorários acabou rendendo, só no Ceará, pagamentos de R$ 108 milhões até outubro passado, que foram retirados dos precatórios pagos aos municípios. Mesmo com o valor exorbitante das ações, a maioria dos contratos entre prefeituras e escritórios foram feitos sem a realização de licitação pública.

Em entendimento já referendado no TCU, Controladoria-Geral da União (CGU), Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Supremo Tribunal Federal (STF), Judiciário e órgãos de controle já decidiram que pagamentos do tipo são ilegais. Em decisões recentes, eles destacam que a verba do Fundeb deve ser destinada exclusivamente para a Educação.

Após a conclusão da auditoria de outubro, o TCU identificou prejuízos em R$ 254,6 milhões – quase a metade deles partindo de contratos do Ceará – e abriu mais de cem tomadas de contas especiais sobre os casos. Nas investigações em curso, são apontados indícios de fraudes e até de dispensa irregular de licitações para a contratação dos escritórios.

“Em vez de incentivar o ingresso das ações mediante órgãos jurídicos próprios ou contratação de advogados por meio de licitação, prevendo cláusulas não abusivas de remuneração, a entidade de defesa dos entes procurou assegurar para si parte substancial dos recursos recuperados”, diz, em acórdão do TCU, o conselheiro Walton Alencar, que destaca ainda que maior parte das verbas foi para “pequeno grupo” de advogados.

Quase todos os processos ainda está em estágio inicial, com apresentação das primeiras alegações de defesa dos envolvidos. A maioria dos gestores envolvidos são ex-prefeitos que exerceram mandatos entre o final dos anos 1990 e o início dos anos 2000. Alguns deles, como Roberto Pessoa (PSDB) em Maracanaú e Nezinho Farias (PDT) em Horizonte, foram eleitos em 2020 e seguem no comando dos municípios.

Outros já deixaram os municípios, mas seguem em posições de destaque na política do Ceará, como o deputado estadual Sérgio Aguiar (PDT) e o secretário de Desenvolvimento Agrário do Ceará, Dedé Teixeira (PT).

Citados em ações devem apresentar defesa conjunta

Prefeitos cearenses que respondem a processos de tomadas de contas especiais por uso de verbas por Fundeb com honorários advocatícios estudam apresentar uma defesa conjunta ao Tribunal de Contas da União (TCU).

A informação é do ex-deputado e ex-secretário do Desenvolvimento Agrário do Ceará, Dedé Teixeira (PT), que foi citado no caso após assinar contrato nesse sentido durante gestão como prefeito em Icapuí, ainda nos anos 2000. Segundo ele, o caso está sendo acompanhado de perto pela Associação dos Municípios do Ceará (Aprece).

“Nós fomos um dos primeiros municípios a receber esse repasse com reajuste, ainda em 2013, 2014, e agora recentemente o TCU intimou a Aprece e, consequentemente, os ex-prefeitos, sobre essa mudança de entendimento”, diz.

“Nós respondemos no mês passado, e a Aprece elaborou toda uma justificativa de que o gasto foi todo legal, até porque, na época, eram processos de alto risco, então nós já respondemos baseado em um parecer da própria Aprece, que participou dessa articulação”.

O ex-parlamentar afirma que deverá, nos próximos dias, procurar advogados da Aprece para avaliar como proceder no caso, mas diz que os prefeitos deverão apresentar “defesa coletiva”, “seguindo a mesma lógica”.

Também citado no TCU, o prefeito de Maracanaú, Roberto Pessoa (PSDB), reafirma legalidade dos contratos. “A contratação de escritório de advocacia, no que se refere à questão da Fundeb, ocorreu plenamente dentro da legislação, conforme entendimento da Procuradoria e Controladoria do Município com base na Lei Federal 8.666/93”, diz.

“A lei permite a contratação de escritório de advocacia quando se trata de serviços especiais e não rotineiros às Procuradorias”, afirma ainda nota da gestão. A gestão, no entanto, ignora decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) destacando que as verbas do Fundeb somente podem ser aplicadas com a Educação. (Carlos Mazza)

Após pressão do MP de Contas, prefeitos recuam de novos editais

Três prefeituras do Ceará recuaram nesta semana e anularam editais que serviriam para contratação de escritórios de advocacia para a representação dos municípios em ações envolvendo recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb).

A anulação dos certames ocorreu após o Ministério Público de Contas, ligado ao Tribunal de Contas do Estado (TCE), entrar com ação na Corte pedindo a suspensão dos editais. Nas ações, procurador de Contas Gleydson Alexandre destaca recentes decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) pela ilegalidade deste tipo de contratação.

O procurador também destaca que, como não existe polêmica jurídica em torno da matéria, as ações poderiam ser tocadas pelas próprias procuradorias dos municípios, sem a criação de qualquer despesa para os cofres municipais. Além disso, as ações também destacam “valores exorbitantes” previstos para os honorários em todos os casos.

Ao todo, os municípios de Aracati, Pacatuba e Mulungu planejavam remunerar os escritórios contratados com cerca de 20% do valor das ações, o que somaria cerca de R$ 25 milhões. Como viriam de ações movidas contra a União e envolvendo o recurso do Fundeb, os honorários acabariam recaindo sobre a verba da Educação.

Município com o edital mais elevado, Aracati planejava pagar cerca de R$ 17,7 milhões em honorários na ação. Procurado pelo O POVO, no entanto, o prefeito Bismarck Maia (PTB) afirmou que o certame já havia sido cancelado. “Já cancelei, resolvi. Mandei a procuradoria mesmo fazer”, disse o prefeito, que não soube precisar o momento da decisão.

Em termo publicado na noite de ontem no Portal de Licitações do TCE, a Prefeitura destaca ação movida pelo Ministério Público de Contas para justificar a anulação do processo. “Cabe ressaltar que a revogação da licitação não decorre da existência de vício ou defeito no procedimento, mas sim diante da conveniência e da oportunidade administrativa e por motivo de relevante interesse público”.

Fato semelhante ocorreu em Mulungu, onde a gestão municipal anulou edital que promoveria gastos de R$ 1,2 milhão da Educação para o pagamento de honorários. Nesta ação, a Prefeitura alegou surgimento de “fatos supervenientes”, embora decisões proibindo este tipo de contratação sejam anteriores ao processo.

Caso mais curioso, no entanto, ocorre em Pacatuba, na Região Metropolitana de Fortaleza. Após a ação do MP de Contas, a gestão Carlomano Marques (MDB) anunciou a anulação de processo para a contratação de escritório de advocacia de pagamento de honorários de até R$ 5,7 milhões.

Imediatamente depois, no entanto, teve entrada no sistema do TCE novo edital exatamente igual ao anterior, com os mesmos valores e também com o objetivo de contratação de advogados para representarem o município em ações ligadas ao Fundef. Neste novo caso, não foi apresentado até agora nenhum termo de revogação do certame.

O MP de Contas, no entanto, já ingressou com nova ação pedindo a suspensão da contratação. O POVO tentou entrar em contato com Carlomano Marques sobre o caso, mas chamadas ao telefone celular do emedebista não foram atendidas. A reportagem também tentou entrar em contato com o vice-prefeito, Rafael Marques (MDB), mas também não conseguiu localizá-lo até o fechamento desta página.

Fiscais

Além das tomadas de contas em andamento no TCU, uso irregular de verbas do Fundeb também é alvo de fiscalização no Tribunal de Contas do Estado do Ceará (TCE)

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