CÍCERA Barbosa, 35, professora da rede estadual: sobrecarga física e emocional durante a pandemia

Condições mínimas de trabalho. Ensino totalmente alterado. Luto pela morte de amigos e parentes em decorrência da Covid-19. Além do enlutamento pela perda da sala de aula. Um adoecimento multifatorial, acentuado durante a pandemia, atinge professores e outros profissionais da educação. Nos últimos dois meses, mais de 1,2 mil buscaram apoio emocional no projeto Sala de Afetos, voltado para escuta dos profissionais de todo o Brasil. Só no Ceará foram mais de 800.

Conforme Renê Dinelli, cearense idealizador da iniciativa, a maioria das pessoas vem da rede pública. Os encontros são online e gratuitos. Não é uma psicoterapia. “Trata-se de um acolhimento a um grupo de professores e outros profissionais da educação, onde possam construir rede de cuidado entre eles. Para além disso, que construam dentro da escola redes de apoio, espaços onde falem das emoções e sentimentos, para de alguma forma se sentirem preparados”, completa o psicólogo educacional e psicoterapeuta.

Nesta segunda-feira, 10, a professora Elizabeth Dias Martins, da Universidade Federal do Ceará (UFC), retoma às aulas remotas para finalizar o semestre 2020.1. Os programas das disciplinas ainda não estão fechados. “Eu e muitos colegas sentimos que fomos jogados a uma realidade que não tínhamos o mínimo de conhecimento e não tivemos o apoio emocional”.

Assim como ela, 83% dos professores brasileiros se sentem nada ou pouco preparados para o ensino remoto, conforme pesquisa do Instituto Península com quase 8 mil docentes, divulgada em maio. O estudo mostra ainda que 75% dos educadores não receberam nenhum suporte emocional das escolas.

Considerada do grupo de risco, a professora do Programa de Pós-graduação em Letras/Literatura Comparada reside com outros pessoas na mesma condição. Elizabeth perdeu amigos, alunos e parentes. “A gente não tem hora para trabalhar. Eu trabalho pela manhã, à tarde, à noite e entro pela madrugada”, relata.

De férias, a professora de geografia da rede municipal, Rosa Sérvio Chaves, 34, adaptará o conteúdo das turmas de três escolas onde ensina. “A gente trabalha muito mais em casa do que nas aulas presenciais. Eu tive muitos sintomas físicos, como enxaqueca, pela exposição o dia inteiro à tela do computador e celular, e muita dor no corpo pela postura”, lembra.

A professora revela ainda preocupação com possível retorno das classes presenciais em setembro. Ela acredita que as estruturas das unidades não estão aptas, não há profissionais suficientes para higienizar os espaços e o plano em elaboração para a retomada não dará conta da biossegurança da comunidade escolar.

Da rede estadual, Cícera Barbosa, 35, leciona história em três escolas no Bom Jardim, e lembra das primeiras alterações da rotina. “Eu chorei muito porque eu tinha de refazer alguns serviços. Eram outras mudanças dentro de um contexto de várias mudanças”, comenta.

A historiadora lembra que teve um encontro presencial de área entre alguns professores, mas não pode ir. Ela conta que participou por videochamada, mas só chorou durante a conversa. “Em uma das escolas, a gestão estava muito preocupada. Ao mesmo tempo, o trabalho em casa é muito solitário. Acordar cedo e ainda não ter nenhum estudante online. Tenho insônia, crises de ansiedade, crise de pânico”, relata.

“Quando foram entregar o vale de 40 reais, alguns estudantes disseram que foi com aquela ajuda que conseguiram comer depois de semanas comendo biscoito. Foi quando conseguiram comprar um arroz. Eu travei muitas vezes por não conseguir tocar essa rotina sofrível”, lamenta.

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